Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

ouvido na infância... ouvido de infância

[imagem obtida aqui]

...que se a gente aproximasse o ouvido de uma concha, escutaria o barulho do mar. Não havia mar onde eu morava, mas havia moluscos, como em qualquer parte, e imaginação. Só muito tempo depois vim descobrir o conteúdo daquelas peças calcárias que encontrava comumente no lugar onde nasci e passei a infância. Escutava o barulho do mar pondo a concha ao ouvido? Criança escuta o que quiser. Quando conheci o mar, na adolescência, não me apaixonei nem nada, sequer o notei, pois a moda era ir à praia. Não o vi, mas ele me viu, pois fiquei muito tempo na água, o calor era forte, experimentei uma força que não conhecia, e acabei desmaiando no dia seguinte ao ver no espelho meu rosto alterado pelo sol. Isso me afastou de praias. Eu descobri o mar quando fui morar no litoral e me dei conta de que não precisava ir à praia para sentir o mar. Bastava tomar um ônibus à noite e ir em direção à praia, sentar em qualquer lugar e, quase indiferente, saber que o mar estava ali, fazendo companhia. Mas faz bem pouco tempo que liberei meus sentidos para perceber o barulho inconfundível do mar. A lembrança do episódio da concha do molusco é uma pérola da infância, esquecida por tanto tempo, e agora secretada pelo mar.

 

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