Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


quinta-feira, 14 de abril de 2011

Emily Dickinson: If the Heart omit / Emaciate the Wit

No Coração a Mente
É uma Parasita ―
Se a comida não falta
Fica repleta ―

Porém se Ele se omite
A Lucidez se embota ―
De tal modo absoluto
Esse alimento.


The Mind lives on the Heart 
Like any Parasite ―
If that is full of Meat
The Mind is fat ―

But if the Heart omit
Emaciate the Wit ―
The Aliment of it
So absolute.

DICKINSON, Emily. Alguns poemas. Trad. José Lira. São Paulo: Iluminuras, 2008, p.136-137.

Este poema causou-me desconforto. Num primeiro momento, li a subordinação da razão aos afetos e entendendo “afeto” num sentido amplo, a leitura não estava equivocada. O alimento que vem do coração. Dentendo-me na palavra “Parasita”, ocorreu-me então que recebem este nome uma miríade de seres, e que as belas orquídeas costumam ser tomadas por parasitas, embora aparentemente usem as árvores apenas como suporte. Imaginar a mente, a razão, o espírito como uma bela flor que depende de fontes obscuras para se suster. Que a mente às vezes parece uma casquinha a depender de fontes que estão em outro lugar, talvez no próprio corpo, mas fontes difíceis de acessar com um simples comando da razão. Se o coração se omite...

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