Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


segunda-feira, 5 de setembro de 2011

mar à vista da ilha

Quando eu encontrei este verso, mar à vista da ilha, intui que tinha em mãos algo cujo alcance me escapava, mas que era melhor não subestimar ― o mar como tudo aquilo que não sou, o oceano da não-identidade batendo nos costados da ilha-subjetividade, tudo mediado pelo forte sentido da visão. Sim, eu li os românticos, mais os teóricos que os poetas. Nada se firmou mais em meu horizonte que a noção de ironia romântica, o movimento entre o eu e o não-eu, o sujeito e o objeto. Uma ilha ainda é uma ilha, mas se tem o mar à vista, o mar por horizonte, então este mar só pode ser o não-eu apreendido na aspereza da leitura de Fichte, Schlegel e Walter Benjamin. Eu não sei o que fazer com tanto mar para navegar, sem abdicar da palavra “eu”. E há, no plano das ressonâncias profundas, um movimento que se fez sem eu me dar conta. Quando comecei a estudar o Romantismo encontrava-me ainda no mestrado. Hoje, enquanto pensava no blog perambulando pela rua ― algo que muito frequentemente acontece ― veio-me a súbita intuição de que a escolha do verso “mar à vista da ilha” abrigava, numa expressão feliz, a teoria romântica do conhecimento que estudei, e que preconizava a arte como a efetivação da manifestação da infinitude subjetiva na concretude da expressão. Como se o sujeito dissesse: tenho um mar em mim, mas como é custoso navegá-lo!

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