Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


terça-feira, 13 de dezembro de 2011

frisson

Um amigo uma vez definiu o significado de frisson ― é aquele som que o vizinho escolhe livremente para você ouvir. Pois hoje meu vizinho de frente foi tomado pela vibração musical: durante toda a tarde reverberou em seus domínios um som que invadiu os domínios que só por acidente posso chamar de meus, e não tanto pela ausência de uma proteção acústica, um imperceptível manto que mantivesse constante a atmosfera de silêncio e de ruídos. Junto com a música alta outra coisa entrou em minha casa, e a tornou menos minha: a liberdade dele de ouvir música no volume que bem entende fere diretamente a minha liberdade, num sentido bem pouco discernível a esta civilização tão acostumada a hábitos, costumes e modos invasivos. Para ele ouvir livremente sua música eu preciso escutar a música dele. 

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