Dora Ferreira da Silva

NOTURNO II

Nossos olhos nos pertencem ―
não o dia.
Amor não nos pertence
nem a morte.
Apenas pousam na pérola mais fina.
Desce o luar
no flanco de rios precipitados
folhas se alongam
caules estremecem.

A noite já desfere
seu punhal de trevas.

Dora Ferreira da Silva. Poesia reunida. Rio de Janeiro: Topbooks, 1999, p.46.

sexta-feira, 8 de junho de 2012

fidelidade

"Nossa coragem se aquece estranhamente em meio ao gelo do medo."

saúde

Há dias em que sou obrigada a concordar com Clarice Lispector: "Ter nascido me estragou a saúde."

quinta-feira, 7 de junho de 2012

João Cabral de Melo Neto

Há gente que se gasta
de dentro para fora,
e há gente que prefere
gastar-se no que choca:

nesta pertence aquela
sempre vertiginosa
que parece habitar
num corpo sobre rodas;

gente que não consegue
parar nenhuma hora
e que assim se aproveita
de toda sua corda

para andar se atirando
contra as coisas em volta,
talvez com esperança
que uma seja pistola.

Talvez, é por prezar
o mundo em que se mova
(a espessura tranquila
de uma coisa que pousa,

a mansidão da coisa
que aceita virar outra)
que essa gente se atira
aos trancos entre as coisas.

Não: é porque ouviriam,
se parassem uma hora,
a voz da alma vazia
dobrando dentro, morta,

a voz que dobra em muitos
mas que neles redobra
porque dentro de crânios
vazíissimos, de abóboda.

MELO NETO, João Cabral de. Serial e antes. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997, p.300-301. 

do texto de um aluno

"Se eu falasse durante o sono seria mais sincero."

quarta-feira, 6 de junho de 2012

passarinhos

“Aí passarinhos que já vão voando, com o menorzinho ralo de luz eles se contentam, para seu só isso de caçar o de comer.” (Grande sertão: veredas. 19.ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001, p.226)