segunda-feira, 20 de novembro de 2023

Gaza

 

Poeta, tradutor, ensaísta, professor e atual diretor da Fundação Biblioteca Nacional (FBN) 

domingo, 19 de novembro de 2023

morte

Se tivesse morrido até a última quarta-feira, morreria ignorando que existe no mundo uma cantora pop chamada Taylor Swift. Sua passagem pelo Brasil deixou dois fãs mortos. Uma fã, Ana Benevides, morreu de desidratação, ao que tudo indica. Ana era da cidade de Sonora, interior do estado de Mato Grosso do Sul. Essa morte tem tantas camadas de capitalismo que é difícil assimilar. A morte precisa ser respeitada, para que a vida o seja. Ela, a morte, tem me rondado. Mas algumas coisas me empurram a continuar. A arte, as cores, a fotografia, a sonoridade e a poesia das canções, como esta, interpretada por dois lindos que já se foram. Fada canção.

CLARICE E MANUEL

― você também veio pra aqui...
― sim, caí como letra viva na página em branco ― e abri a porta.

poesia

 A poesia é feita com as sobras da vida. Não serve pra nada. Mas, sem ela, as sobras se acumulam.

CONVIVO MUITO BEM COM OS CÃES DA RUA - RICARDO ALEIXO

Convivo muito bem com os cães da rua. 

Me apraz o velho e bom modo de vida 

que os faz, sem ter do que cuidar na vida, 

medir distâncias de uma a outra rua. 

 

Comparto com os cães o ar da rua. 

Se um deles me dirige um riso cardo, 

como quem dissesse “E aí, Ricardo?”, 

respondo-lhe: “Olá, irmão!”. E a rua, 

 

que até há pouco era só mais uma rua 

por onde vadiavam um cão e um bardo 

(cada um caçando, do seu jeito, a vida), 

 
me obriga a distinguir, nela, o que é vida 

real do que será, quem sabe, um tardo 

sinal do quão são irreais o cão e a rua. 


ALEIXO, Ricardo. Pesado demais para a ventania: antologia poética. São Paulo: Todavia, 2018, p.149.