A coisa do errante navegante. Tenho o luxo de poder dizer que morei em três das quatro capitais do Sudeste — Vitória, Belo Horizonte e agora Rio de Janeiro, dessa vez pra ficar. Um detalhe apenas: a cada vez que cheguei num novo lugar, tive que começar tudo de novo, e aí aprendi uma coisa fundamental: a diferença entre os que trazem e os que não trazem amigos do jardim de infância. Pertenço ao segundo grupo, por uma razão muito simples, da qual decorrem as outras que se podem supor: no interior onde nasci a escolarização começava no primeiro ano primário, não havia pré-escola como agora. Quer dizer: a pré-escola ia se fazendo no aprendizado estranho da vida. Meu jardim de infância foi outro... Meu pai era lavrador, e trabalhava um pouco longe de casa, de forma que às vezes levávamos o almoço dele, para que ele não tivesse sempre que se alimentar com uma marmita fria ― já bastava o trabalho pesado, ingrato, mal remunerado, de sol a sol. O lugar em que ele trabalhava se chamava “Grota Funda”, e até chegar lá dentro, na plantação, havia todo um caminhozinho que minha memória recompõe com bastante dificuldade, talvez alguns trechos sejam mesmo imaginados ou sonhados. Mas no trajeto havia uma água que corria, menos que um regato, um trecho de aguinha transparente que se destacava da vegetação, correndo por sobre pedras. Devia ser água próxima de alguma fonte ou nascente. Havia um frescor muito especial naquele lugar, onde eu me detinha, antes ou depois de levar a marmita, para olhar a água correndo cristalina entre pedras e vegetação. Lá foi meu jardim da infância. E há um imponderável nisso tudo, que o discurso não comporta.
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