quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

então certo dia eu quase morri...

Há intervalos em que a vida abre uma brecha. Num deles eu me vi morrendo, ou quase. Faz já bastante tempo, mas a memória de tudo é vivíssima. Abriu-se uma brecha, um intervalo, entre uma cidade e outra, uma vida e outra, era uma passagem, como quando o relógio bate meia-noite e não se sabe se é 24h ou zero hora. Aquele intervalo que não já não mas ainda não é. Um momento zero, nada, nulo, vazio, amplo como o horizonte que se descortinava à minha frente. Abriu-se uma brecha, e então aconteceu. Era tudo muito estranho, mas eu sabia bem o que era. Era abismar-se em alguma coisa jamais experimentada ou sentida. Mais do que isso, jamais suposta ou imaginada. Quem poderá entrever o imprevisível? Medo, muito, daquela súbita vertigem ou desordem. E, na desordem, na vertigem (perceber-me abismando não sei bem em quê), a ordem rápida, imperiosa, para voltar, para a vida evidentemente. Sentir-se morrendo em vida, sentir a vida, não a física, mas a outra, imponderável, escapando. À ordem de voltar, vinda dos confins de mim, daquilo que em mim supostamente sabe onde está a bússola, eu fui voltando. Pois se morrer é inevitável, sentir-se morrendo em vida é alguma coisa que vai acontecer com algumas pessoas, e só com elas, e que pode ser percebida ou não. Por acaso eu percebi, e toda vez que a coisa vai ficando esquisita, eu me lembro daquele dia, da luta travada, em pé num ônibus, olhando o nada, a paisagem, abismando-me em mim mesma. Eu estive lá, não sei bem onde, e voltei. 

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