segunda-feira, 6 de junho de 2011

A hora do cansaço (um dos títulos possíveis para "A hora da estrela")

Chega uma hora que bate o cansaço. Começa então uma fase de paciente mas definitiva depuração, de recusa aos pequenos e gratuitos mise-en-scènes que ainda parecem divertir os mais jovens; aos gestos que mal escondem sua teatralidade, inútil de todo modo, pois a fase performer, a sua, já passou; aos gestos que, sugerindo seu contrário, mal escondem o vazio que se encontra em sua origem; aos que ainda se agitam no vazio. Já basta o alto custo de viver, como disse a Clarice Lispector na crônica "Um ato gratuito". A hora do cansaço chega exatamente quando se tem a noção desse custo, quando uma intuição funda e certeira mostra tudo que foi percorrido para se estar sentado, numa segunda-feira à noite, diante de uma tela fria escrevendo, depois de um dia exaustivo de trabalho. Tudo: quatro décadas de existência, sem qualquer promessa de que haverá outras quatro. Quatro décadas de esforço, luta, obstinação, entrega aos estudos, entrega a uma promessa, a muitas esperanças, a um sonho de futuro, à busca de um lugar no futuro. Soaria irônico se eu fosse pensar em garantir um bom lugar para o meu futuro, daqui a quatro décadas, pois só há um lugar, um ponto de chegada, um fim, que iguala a todos.

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