Escrevo depois da chuva. Rasgo linhas como a chuva ― água chamada à terra pelo ciclo atmosférico ― rasga o espaço precipitando-se no chão. As palavras precipitam-se no papel, no seu papel de palavras. Qual é o papel das palavras? O papel branco ― solo ― recebe palavras cujo intento seria, aprende-se muito cedo, comunicar. Um qualquer papel recebe palavras e isso às vezes nada comunica em sua exterioridade, assim como uma chuva pode não despertar nada em quem a mira ― o que talvez seja difícil. Uma chuva pode chegar de muitas maneiras, com alarde ou silenciosamente impressentida ― às vezes, de tão mansa, percebe-se apenas que choveu, ou então que chove uma chuva tão fininha, leve, quase água a flutuar antes de tocar o inevitável solo da gravidade. Mas é como se a gravidade não existisse, e a água estivesse solenemente caindo devagar, como um hino à natureza, desejando, em seu lento tombar, que alguém a note (anote), chuva, água, espanto de que as coisas ainda estejam vivas, beirando o sublime, quando tudo à volta parece conspirar para a morte. Uma chuva assim num domingo à tarde é uma mensagem do céu.
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