segunda-feira, 30 de abril de 2012

a palavra-escrita

Escrever é um ato solitário, impermutável, intransferível. Escreve-se com o corpo, com as mãos, dobrando cada palavra ao gesto de querer simplesmente marcar, sulcar um veio no terreno de que a trama dos sentidos emana. Retomo o comentário da Helena a propósito do poema de Ana Hatherly: Pois é isso mesmo que a palavra é: um gesto arcaico!“A palavra-escrita/ é um labor arcaico:/ sulca enigmas/ venda e desvenda/ o sentido do gesto” ― A palavra-escrita torna-se um novo substantivo: não é apenas a palavra escrita, é a palavra tornada escrita, quase obrigada a sulcar enigmas, traçar linhas numa folha como o tempo traça rugas na face. É a escrita que arranca a palavra de seu estado de dicionário para obrigá-la a ser o que afinal justifica sua existência, da palavra-escrita: gesto que liberta a garganta das constrições do tempo, que impõe bem mais que rugas à face. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário