sábado, 15 de setembro de 2012

Caê Guimarães

QUARTO DE TORQUATO

Por vezes ando assustado, como os pombos.
Porque corro,
concordo com o boicote ao estado normal das coisas.
Tiro do meu afeto todos meus segredos
- quinhões de coragem e medo -
olho desatento para os lados,
e impaciente não me percebo em lugar nenhum.

Não acredito mais no amor de múmias.
Elas também fedem sob as gazes encardidas.

Múmias podem até ser divertidas.

Instantâneo: poesia e prosa. Vitória: Secretaria de Estado da Cultura do Espírito Santo, 2005, p.82.

Herberto Helder

"a escrita, pavorosa delicadeza a progredir"

cristo mais certo que os cristãos

De algumas coisas (e leituras) não vale sequer a pena tentar se defender.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Herberto Helder

"Eu quero gritar paralém da loucura terrestre."

poesia de circunstância

Com miúda paciência
encontrar a cada dia
um verso... sem
consciência.

vida amanhecendo

A aragem da manhã tornou-se vento forte, impetuoso. Quando cedo se acorda, o dia ainda é embrionário ― acordar cedo, por um deslizamento de sentidos, torna-se entrar em contato com as próprias promessas, o frescor que palpita na vida amanhecendo.

Clarice Lispector

POESIA

― Fiz hoje na escola uma composição sobre o Dia da Bandeira, tão bonita, mas tão bonita... pois até usei palavras que eu nem sei bem o que querem dizer.

Clarice Lispector. A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999, p.316.

Clarice Lispector

SEGUIR A FORÇA MAIOR

É determinismo, sim. Mas seguindo o próprio determinismo é que se é livre. Prisão seria seguir um destino que não fosse o próprio. Há uma grande liberdade em se ter um destino. Esse é o nosso livre-arbítrio.

Clarice Lispector. A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999, p.140.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Alexei Bueno: livro de haicais

Entre o sol e as flores
Como é difícil às vezes
Desdenhar tal mundo.

BUENO, Alexei. Livro de haicais. Poesia reunida. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2003, p.214.

definição de poesia

É o que restitui a respiração ao ritmo quase imperceptível da normalidade.

roberto arlt, do conto "escritor fracassado"

“Sou um burguês egoísta. Reconheço. E é por isso que nada chega a me indignar de verdade. Seja bom ou mau. Também não experimento um desejo ardente de deslumbrar meus semelhantes. Se eu disse em alguma ocasião que sofria quando não conseguia escrever, é mentira. Afastei-me da verdade para enfeitar minha personalidade com um atributo capaz de torná-la interessante.”

Roberto Arlt. As feras. Trad. Sérgio Molina. São Paulo: Iluminuras, 1996, p.63.

domingo, 9 de setembro de 2012

UMA NOITE EM 67 (documentário completo)

entrevistas e vídeos com chico buarque, caetano veloso, roberto carlos, 
gilberto gil, mpb4 e edu lobo; outros filmes nacionais no youtube

Orides Fontela

Inútil a ternura pelo leve
momento a desprender-se do infinito:
frágil, a construção do tempo é morte
do que se atualiza. Mais fecundo

é secundar o pássaro buscando
o momento possível, voo pleno.
Mais fecundo é voar. Mas a ternura
(este pássaro morto abandonado

como forma perdida de nós mesmos)
nos alimenta em sua sombra. Torna-nos
em sombras sem alento. E sofremos

como pássaros frágeis: desprendidos
do voo pleno nos cristalizamos
realizando a morte que vivemos.

FONTELA, Orides. Poesia reunida. São Paulo: Cosac Naify: Rio de Janeiro: 7 Letras, 2006, p.266.

vagando alto

Uma palavra, redonda. Outra palavra, torta. Uma terceira, áspera. A quarta, inquietação. Na sequência: O torturado exaspera-se em silêncio

ponte aérea para os sonhos

O sonho de viver no sonho que reproduz a vida dia ou noite, qual deles é nossa verdade? Ou seremos um compósito dos dois, sabendo de si o pouco que o dia dá e tomando a noite como recalque? O sonho, absurdos por vezes inaceitáveis, mas que estão lá, manifestando-se pela manhã como restos da noite. E o que a lembrança não acessa, e por isso sequer imagina ou supõe? Existirá?