sábado, 10 de agosto de 2013
Georg Trakl
CALMA E SILÊNCIO
Pastores enterraram o sol na floresta
nua.
Um pescador puxou
Um pescador puxou
a lua do lago gelado em áspera
rede.
No cristal azul
Mora o pálido Homem, o rosto apoiado nas suas estrelas;
Ou curva a cabeça em sono purpúreo.
Mora o pálido Homem, o rosto apoiado nas suas estrelas;
Ou curva a cabeça em sono purpúreo.
Mas sempre comove o voo negro dos
pássaros
Ao observador, santidade de flores azuis.
O silêncio próximo pensa no esquecido, anjos apagados.
Ao observador, santidade de flores azuis.
O silêncio próximo pensa no esquecido, anjos apagados.
De novo a fronte anoitece em pedra
lunar;
Um rapaz irradiante
Surge a irmã em outono e negra decomposição.
Um rapaz irradiante
Surge a irmã em outono e negra decomposição.
George Trakl. De profundis e outros poemas. Trad.
Claudia Cavalcanti. São Paulo: Iluminuras, 2010, p.53.
Julio Cortázar
HISTÓRIA
VERÍDICA
Um
senhor deixa cair ao chão os óculos, que fazem um barulho terrível ao bater nos
ladrilhos. O senhor se abaixa aflitíssimo porque as lentes dos óculos custam
muito caro, mas descobre assombrado que por milagre elas não se quebraram.
Agora
esse senhor sente-se profundamente grato, e compreende que o acontecimento vale
por uma advertência amistosa, de maneira que se dirige a uma ótica e compra
logo um estojo de couro acolchoado, com proteção dupla, como precaução. Uma
hora depois deixa cair o estojo e ao abaixar-se sem maior preocupação verifica
que os óculos viraram farelo. Esse senhor leva tempo para compreender que os
desígnios da Providência são insondáveis e que na realidade o milagre aconteceu
agora.
CORTÁZAR, Julio. Histórias de cronópios e de famas. Trad.
Glória Rodriguez. 12.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2009, p.72.
sexta-feira, 9 de agosto de 2013
quarta-feira, 7 de agosto de 2013
terça-feira, 6 de agosto de 2013
domingo, 4 de agosto de 2013
Ferreira Gullar
NÓS, LATINO-AMERICANOS
À Revolução Sandinista
Somos todos irmãos
mas não porque tenhamos
a mesma mãe e o mesmo pai:
temos é o mesmo parceiro
que nos trai.
mas não porque tenhamos
a mesma mãe e o mesmo pai:
temos é o mesmo parceiro
que nos trai.
Somos todos irmãos
não porque dividamos
o mesmo teto e a mesma mesa:
divisamos a mesma espada
sobre nossa cabeça.
não porque dividamos
o mesmo teto e a mesma mesa:
divisamos a mesma espada
sobre nossa cabeça.
Somos todos irmãos
não porque tenhamos
o mesmo braço, o mesmo sobrenome:
temos um mesmo trajeto
de sanha e fome.
não porque tenhamos
o mesmo braço, o mesmo sobrenome:
temos um mesmo trajeto
de sanha e fome.
Somos todos irmãos
não porque seja o mesmo sangue
que no corpo levamos:
o que é o mesmo é o modo
como o derramamos.
não porque seja o mesmo sangue
que no corpo levamos:
o que é o mesmo é o modo
como o derramamos.
Ferreira Gullar. Toda
poesia. 19.ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2010, p.378.
Luciano Candisani
Luciano Candisani Photography / Luciano Candisani Fotografia. Reportagem do Almanaque aqui.
