Escrever, escrever, escrever... porque é preciso, porque preciso, na imprecisão com que a memória se move, com que tudo se move, exceto os ponteiros do relógio. Talvez. "Na própria precisão com que outras passagens lembradas se oferecem, de entre impressões confusas, talvez se agite a maligna astúcia da porção escura de nós mesmos, que tenta incompreensivelmente enganar-nos, ou, pelo menos, retardar que perscrutemos qualquer verdade" ― afirma um dos narradores de Guimarães Rosa. Escrever é minha liberdade, posso ir e vir com as palavras: ir até onde elas me levam, voltar até onde elas permitem. Sinto-me quase feliz ao descobrir que posso criar por meio da linguagem. Pois sei que consigo pouco. Não creio que haja qualquer verdade encoberta pela maligna astúcia da porção escura de nós mesmos. Simplesmente porque o acesso possível a esses recessos se faz por meio da arte, do sonho, da música, da criação, do amor. E sai-se sempre com farrapos de verdade, como se a verdade fosse uma mendiga a que devemos socorrer e alimentar, em troca do pouco que ela tem a nos oferecer. No entanto ela não vai embora, fica ali, num canto escuro sombrio, a incomodar, pedindo atenção. Sei que isto está pela metade, mas vai ficar assim. Está tarde, preciso dormir, dar ensejo para a verdade.
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