Sempre disse ao senhor, eu atiro bem.
E esses dois homens, Fancho-Bode e Fulorêncio, bateram a bota no primeiro fogo que se teve com uma patrulha de Zé Bebelo. Por aquilo e isso, alguém falou que eu mesmo tinha atirado nos dois, no ferver do tiroteio. Assim, por exemplo, no circundar da confusão, o senhor sabe: quando bala raciocina. Adiante falaram que eu aquilo providenciei, modo de evitar que mais tarde eles quisessem vir com alguma tranquibérnia ou embusteira, em fito de tirarem desforra. Nego isso, não é verdade. Nem quis, nem fiz, nem praga roguei. Morreram, porque era seu dia, deles, de boa questão. Até, o que morreu foi um só. O outro foi pego preso – eu acho – deve de ter acabado com dez anos em alguma boa cadeia. A cadeia de Montes Claros, quem sabe. Não sou assassino. Inventaram em mim aquele falso, o senhor sabe como é esse povo. Agora, com uma coisa, eu concordo: se eles não tivessem morrido no começo, iam passar o resto do tempo me tocaiando, mais Diadorim, para com a gente aprontarem, alguma traição ou maldade. Nas estórias, nos livros, não é desse jeito? A ver, em surpresas constantes, e peripécias, para se contar, é capaz que ficasse muito e mais engraçado. Mas, qual, quando é a gente que está vivendo, nos costumeiro real, esses floreados não servem: o melhor mesmo, completo, é o inimigo traiçoeiro terminar logo, bem alvejado, antes que alguma tramóia faça. Também, sei o que digo: em toda a parte, por onde andei, e mesmo sendo de ordem e paz, conforme sou, sempre houve muitas pessoas que tinham medo de mim. Achavam que eu era esquisito.
ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. 19. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001, p. 177.