Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


sábado, 12 de março de 2011

as mudanças na nossa vida, as importantes, são mais demoradas

Num comentário no outro blog, acerca de uma imagem do mar, ia me estendendo, não conseguia parar. Mas alguma polidez fez com que eu me detivesse. Havia algo importante que eu queria dizer, uma necessidade me atravessando, e no entanto uma espécie de autocensura me deteve. Associava o mar ao não conhecer, e isso engendrando transformações. 

Mas minha necessidade de escrever desconhece qualquer fronteira, e como temo cansar as pessoas venho para cá, para o (loucos a menos), onde a ideia é cultivar a saúde pela escrita. O mar do meu desconhecer... é como se pela escrita eu pudesse devassar oceanos de interioridade, não necessariamente de subjetividade, até esvaziar-me de mim. Luto para me livrar de um modelo assimilado de escrita, que contorna o pensar pelo bem-pensar. A escrita como um caminho para o mar, para investigar-me. Havia uma euforia qualquer em minhas palavras, em minha intenção de dizer. Algo ali se perdeu, no interdito. Num blog que sigo, uma moça escreveu algo simples, que gostaria de ter escrito: "Uma moça tímida que cria um blog para poder gritar um dia. Um blog cheio de postagens com gritos deletados." Não sei onde ela foi buscar inspiração para dito tão espirituoso, o fato é que estava dito ali algo que, talvez saído de meus dedos, significasse outra coisa: como saber o que as pessoas querem dizer com seus textos? Nós somos/temos a letra, e às vezes alcançamos nos comunicar pelo espírito. A palavra grito pode significar coisas bem distintas, e pode também significar o mesmo, mas o que importa é que eu recortei isso, meu olhar re-conheceu esse trecho, porque ele me atravessou, significou em mim. Que confusão isso tudo!

Então, entre pequenos gritos, para não assustar demais as pessoas, vão-se tecendo textos, vidas. A moça percebeu bem esses limites: gritos deletados: uma forma de gritar não gritando, gritar em surdina, gritar civilizadamente. O Munch gritou, e todo o século XX escutou seu grito. De alguma maneira é preciso fazer-se escutar. Porque sempre haverá o grito, abafado ou não, não importa, e quanto mais abafado mais estridente. Então o mar que desejo é o que posso atravessar pela escrita, sobretudo o que pode (me) ser revelado pela escrita, pela poesia, pela filosofia. Escrever me liberta, embora eu saiba o quão estreitos sejam os vãos por onde a liberdade trafega. E a linguagem é um milagre que permite a elegância do grito.

da inutilidade de quase tudo

PRE-POSFÁCIO

Poeta sou! cumpro o meu Fado, estranho
Como o dum santo ou um louco:
Só posso dar demais ou muito pouco,
Que é tudo quanto tenho.

Fonte: José Régio: Antologia. Seleção e org. Cleonice Berardinelli. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985, p.201. 

Nina (Heitor Dhalia, 2004)


Nina é uma adaptação sombria de Crime e castigo, não fosse a expressão adaptação sombria uma redundância no caso do romance em questão. Assisti ao filme antes de ter lido o livro, e isso não fez muita diferença: o filme prescinde do conhecimento do livro, tornando-se uma transposição para as ruas de São Paulo do drama criado por Dostoiévski. Nina é e não é Raskólnikov, ela passa fome em virtude de sua condição social e por nutrir ideais que não são os mesmos de sua geração. Os dois papeis principais são muito bem interpretados por Guta Stresser (Nina) e Myriam Muniz (Dona Eulália), esta beirando a perfeição. O que parece digno de nota na proposta de Heitor Dhalia é conceber um filme na contramão do cinema de digestão fácil produzido/consumido no Brasil. Mesmo seu posterior O Cheiro do Ralo, estrelado por Selton Mello, parece trair uma vocação mais comercial. Nina é um filme que põe em cena uma moça inteligente e bonita passando fome numa grande metrópole: a protagonista não tem nada de Macabéa. Ela é extremamente lúcida e inteligente, mas isso não impede que ela enverede por uma via fantasmática e alucinatória. De uma forma ou de outra, são colocadas a nu engrenagens difíceis de contornar, e este é o ponto-chave do filme, ao focalizar o modo como essas engrenagens vão criando novas subjetividades, que alucinam: é na subjetividade dilacerada que a crítica social se faz, exatamente como em Dostoiévski. Então, para um país de contornos sociais tão problemáticos como o Brasil, pensar na atualidade de filmes como Nina é pensar que o panis et circensis largamente oferecido pode estar escamoteando fins que visam justamente manter as condições que engolem jovens da metrópole como Nina ou nordestinas mal alimentadas como Macabéa. Segue um pequeno comentário (aqui).

tenho uma Bisa Bia, não serei Bisa Bel

Na verdade, tenho uma Bisa Bel. Explico: ao mexer em papeis antigos na casa da minha falecida avó materna, deparei-me com alguns documentos referentes à imigração. Juntei tudo, e está guardado na casa de minha mãe. Já tinha ouvido falar de minha bisavó, havia inclusive um retrato dela na parede ao lado de meu bisavô, a cara trancada, séria. Não sei onde foi parar essa fotografia antiga. Me contaram seu nome: Anna Elizabeth Hoffman (não tenho certeza da grafia correta). Um nome como este parece ser o de uma fortaleza. Vi num papel miúdo escrito Anna, passaporte de vinda para o Brasil com um ano de idade, proveniente de um cantão da Suíça (os demais antepassados vieram da Itália). Me apaixonei pelo nome, lamentando que o sobrenome tenha se perdido na ladainha matrimonial e civil que faz a mulher agregar o sobrenome do marido, apagando ou ofuscando o seu. O sobrenome que trago comigo vem do lado masculino da família, de meu bisavô paterno. Então, numa dada época, quando nutri fantasias ligeiras de ter uma filha, tinha certeza de que ela se chamaria Anna Elizabeth, nada menos que um nome de rainha. Sem ter tido uma filha, eu fiz certa Anna Elizabeth existir, inclusive por um apelido carinhoso: Belinha.


Contextualizando: Bisa Bia, Bisa Bel tem como eixo o estranho diálogo que a menina Isabel estabelece com sua bisavó Bia e, ao mesmo tempo, com uma futura bisneta sua, para quem ela se torna Bisa Bel. 

sessão nostalgia: anos 80


Essa é de fato uma sessão nostalgia, dos anos 80, mas também de mim nos 80. Uma nostalgia de mim mesma. Eu não passava de uma adolescente quando vários crooners e nomes de peso do pop rock resolveram se reunir em prol de uma causa humanitária e cantaram We Are The World. Sem hipocrisia ou falso desdém: ficou bonito. A época pedia. É ímpar ter vivido a adolescência nos anos 80: havia uma promessa de qualquer coisa que não se cumpriu, havia uma esperança, creio que havia mais boa vontade de construir um mundo melhor, sentimentos que também costumam pontificar na adolescência. Ou quem sabe é a memória do que eu era então que os projeta na época. Não havia qualquer contradição entre ser inteligente e acreditar no ser humano. Eu acreditava sobretudo em mim, e a vida fluía. Não é que não havia problemas: havia esperança, mas de um modo que nem precisava saber que havia. A memória é movediça, sou e não sou a adolescente que fui. Alguma coisa muito boa daquele tempo persistiu, latente, e vem ressurgindo. 

sexta-feira, 11 de março de 2011

Bisa Bia, Bisa Bel

“Mas eu já estou me entendendo um pouco 
e às vezes isto me basta.”

Ana Maria Machado. Bisa Bia, Bisa Bel. 3.ed. São Paulo: Salamandra, 2007, p.65.

o espírito e a letra

Como num comentário recente refiro um artigo de Sérgio Buarque intitulado "O espírito e a letra", a propósito de uma tradução de Thomas Mann no Brasil, vem-me à lembrança um conto de Guimarães Rosa que seria uma tradução/recriação de A montanha mágica. Trata-se de "Nada e a nossa condição", constante das Primeiras estórias. Já ouvi sobre este conto a anedota de que teria sido feito de encomenda por setores progressistas interessados em discutir a questão da distribuição de terras no Brasil. Desnecessário dizer que guardei apenas na memória o registro da anedota. Um professor me disse a respeito: pediram ao cara errado. O que me fez suspeitar da presença de A montanha mágica em "Nada e a nossa condição"? A atmosfera do conto, o espaço, a onomástica, o próprio título estranho do conto, seu desfecho em fogo, em nada. O que dizer de um protagonista chamado Tio Man'Antônio? "Na minha família, em minha terra, ninguém conheceu uma vez um homem, de mais excelência que presença, que podia ter sido o velho rei ou o príncipe mais moço, nas futuras estórias de fadas. Era fazendeiro e chamava-se Tio Man'Antônio. Sua fazenda, cuja sede distava de qualquer outra talvez mesmo dez léguas, dobrava-se na montanha, em muito erguido ponto e de onde o ar num máximo raio se afinava translúcido". Guimarães Rosa parece entrever que no nome Thomas Mann está latente a palavra montanha, e faz ambas confluir em Tio Man'Antônio (quase tio da montanha), o que fica mais claro no último enunciado: "Man'Antônio, meu Tio". [Primeiras estórias. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988, p.73-82]

Mas faz bastante tempo que li o conto, de forma que isso é apenas uma impressão superficial. Guimarães Rosa conhecia bem o idioma alemão, o mesmo se passando com Sérgio Buarque, que entrevistou Thomas Mann quando morou em Berlim, em 1929, às vésperas de Thomas Mann ser laureado com o Nobel, confirmando, mediante depoimento do próprio romancista, a mãe de origem brasileira. [HOLANDA, Sérgio Buarque de. Thomas Mann e o Brasil. Raízes de Sérgio Buarque de Holanda. Org. Francisco de Assis Barbosa. Rio de Janeiro: Rocco, 1989, p.199-204. Entrevista concedida em 18 de dezembro de 1929] 

falcões da noite (trecho de Anna Livia Plurabelle)

Falcões da noite escutem-nos. Noite! Noite! Toda minha cabececoa. Me sinto tão pesada quanto aquela pedra lá no chão. [Dark hawks hear us. Night! Night! My ho head halls. I feel as heavy as yonder stone]. 

Trecho de Anna Livia Plurabelle traduzido por Dirce Waltrick do Amarante. Para ler Finnegans Wake de James Joyce. São Paulo: Iluminuras, 2009, p.152-153.

restos da noite

Pela manhã, cumpre organizar a parte organizável dos sonhos, os restos da noite. Confusão de imagens e situações, lampejos que ficam só no lampejo. Essa outra vida que se vive ao migrar placida-mente para o território da noite, vida intensa de imagens e acontecimentos quase paupáveis, interditos que se abrem, em graus variáveis de interdição, à consciência. Pela manhã decantam-se fragmentos de sonhos, entre o interdito e o desejo de trazer para o dia a noite adentrada pela consciência, mar pouco navegável, rio a fluir enquanto a noite de cada dia leva a estranhos domínios do ser, como uma casa que tivesse aposentos secretos, mas que só fosse possível saber deles e entrevê-los enquanto se dorme e sonha. Cada manhã, então, é o retorno de incursões a esses aposentos, para os corredores claros da casa, trazendo, no entanto, como enigma, as sobras e sombras da passagem por eles. O que se consegue trazer para o dia são as sombras dos sonhos, e mesmo isso é difícil de dizer, porque é outra coisa, e as sombras são fugidias, dependentes da luz, mas a noite é a ausência da luz. Então a luz do dia projeta-se sobre a noite, e consegue-se entrever os sonhos que esta luz permite atravessar, como uma fronteira, da noite para o dia.

The Enigma of a Day, Giorgio De Chirico
[imagem obtida aqui]

quinta-feira, 10 de março de 2011

"dotôra"

Acabei de atualizar o lattes, fazendo lá constar que agora sou "dotôra". Não que isso tenha mudado qualquer coisa de substancial em mim. No meio da confusão que tem sido minha vida, a última coisa de que me lembro é o título. Não pertenço ao grupo dos que se autointitulam doutores/as por mero hábito do ministério (ou monastério): médicos, advogados, políticos: os doutores por convenção que grassam no país dos bacharéis, dos quais Oswald de Andrade fez troça no Manifesto da Poesia Pau-Brasil: "O lado doutor, o lado citações, o lado autores conhecidos. Comovente." [aqui] Trata-se de fugir da erudição de verniz e admitir que o título, além de representar a culminância de uma etapa longamente ensaiada (desde que escolhi Letras sabia que iria me doutorar em Literatura Brasileira), representa melhorias efetivas de salário. Amigos brincaram de forma até surpreendente com o título, mas eu levei na esportiva. O que conta é que consegui o que eu queria: fazer um doutorado que representou uma possibilidade efetiva de aprendizado e crescimento pessoal, numa instituição de minha escolha. Acho que as minhas fichas ainda não caíram, só agora começo a perceber o que efetivamente conquistei.

"porque somos um pouco o que nos atravessa"

No ...rastros de carmattos consta: "porque somos um pouco o que nos atravessa". Somos. No 3x4, consta: sem-carro, sem-filhos, sem-facebook. Perfeitos os três adjetivos. Sou uma das poucas pessoas que conheço que deliberadamente abdicou de ter carro, e consigo contar nos dedos as pessoas das minhas relações que não estão no facebook. Quanto aos filhos, é mais fácil explicar. Em tempo: não sei onde foi parar meu idealismo.

Trk (Run): uma perspectiva curiosa sobre a vida

quarta-feira, 9 de março de 2011

Symphony

[Informações sobre o curta aquiMúsica: Vivaldi, As quatro estações: Summer]

Mário Faustino

VIAGEM

Apago a vela, enfuno as velas: planto
Um fruto verde no futuro, e parto
De escuna virgem navegante, e canto
Um mar de peixe e febre e estirpe farto
E ardendo em festas fogo-embalsamadas
Amo em tropel, corcel, centauramente,
Entre sudários queimo as enfaixadas
Fêmeas que me atormentam, musamente
E espuma desta vaga danço e sonho
Com címbalos e símbolos, harmônio
Onde executo a flor que em mim se embebe,
Centro e cetro, curvando-se ante a sebe
Divina ― a própria morte hoje defloro
E vida eterna engendro: gero, adoro.

FAUSTINO, Mário. O homem e sua hora e outros poemas. São Paulo: Companhia de Bolso, 2009, p.171.

Fica sempre uma cogitação: quanto mais teria dado a poesia de Mário Faustino se sua vida não tivesse sido inesperadamente abreviada por um acidente aéreo, aos 32 anos de idade? (aqui)

viagens

Viagens têm um estranho poder: alguma coisa do que é alteridade no "eu" é confrontada, e volta-se com a sensação de que uma transformação intensa se deu num intervalo curto de tempo: como se o tempo tivesse sido subitamente intensificado. Então escrevi isso a uma amiga: "Voltei mais leve, se é que posso dizer assim. Não sei se a insustentável leveza do ser, mas quem sabe um novo modo de sentir-se magra." E, só agora o vejo, escrevi/disse sentir-se, e não sentir-me. Pensei na associação entre leveza e magreza quando um outro amigo, ao falar da defesa, disse que eu estava mais leve, em todos os sentidos. Intui que uma das maneiras de estar leve seria tirar partido da própria magreza, já que era tudo o que eu tinha então, além da sensação do percurso trilhado, e tudo o mais estava sufocando/oprimindo demais. E comecei a exercitar isso, pois afinal é-se corpóreo em quase tudo que se vive. Era mais ou menos assim: já que possuía os pré-requisitos, tinha um caminho por onde começar. Eu tinha esses, a magreza e certa disposição íntima de desligar-me um pouco mais das coisas, já em curso, e não outros: cada um precisa se haver com o que tem. E vem funcionando. Voltei mais despojada de mim, com menos pressa, mais paciência. Força também, quem sabe, de ter novamente enfrentado o desafio do avião, vivenciando uma situação nova: apesar do receio que ainda me toma de assalto, e que se condensa na hora de entrar na aeronave, uma vez lá em cima consigo vivenciar coisas muito agradáveis, interrompidas, é claro, pela travessia de áreas de instabilidade e pelos episódios de turbulência. Mas não é assim na vida? Indescritível a leveza que sinto lá em cima, uma vez vencidos, como na renovação de um rito, os obstáculos íntimos que me fazem ter receio de entrar na aeronave. 

Aeroporto de Brasília, 08/03/2011

a pedra e o beco

Drummond viu a pedra, Bandeira viu o beco, pedra abrindo caminho no beco. Gastar com palavras a pedra (água mole em), vencendo a umidade do beco. No berço da pedra, a perda. No desejo da pedra, o beco. Pedra afundando no beco, beco fundo onde a pedra perde sua aspereza. Beco em que a pedra encontra seu caminho, abrindo passagem ao ser. A pedra suavizando o beco, o beco esculpindo a pedra, abrindo as comportas do viver.

Admirável Gado Novo


Não sou fã de Zé Ramalho, mas não escapa o parentesco desta canção com o romance Admirável mundo novo, de Aldous Huxley, livro tão impactante que faz o leitor acreditar piamente que o mundo não passa de um sutil sistema de castas mantido à base de narcóticos controlados, a tal ponto que a pessoa nem chega a suspeitar que pode haver um modo diferente de viver. Zé Ramalho apanha a deixa de Huxley, e num curioso emprego da noção de dêixis, associada ao lugar comum inteligência de rebanho, dirige-se diretamente ao grupo supostamente vítima da alienação, numa engrenagem complicada de desmontar, porque sente a ferrugem lhe comer: "Vocês que fazem parte dessa massa / Que passa nos projetos do futuro." Será ouvido? Não, ou melhor, ele é ouvido por quem desconfia dos mecanismos da alienação, o que não invalida a intenção de se fazer ouvir: "O povo foge da ignorância, apesar de viver tão perto dela." Vale notar que a canção data do final da ditadura, época sombria em que o povo marcado fazia as vezes de povo feliz. Cássia Eller deu roupagem nova à canção (aqui).

Madalena a Jesus - Henrique Manuel Bento Fialho

Confessa que te assustas quando olhas a morte
e te apercebes do quão insignificantes somos.
Confessa que, por vezes, no silêncio
das quatro paredes em que adormeces,
olhas o tecto na escuridão e lembras-te
que pode ser a última vez que o estás a olhar.
Confessa que sentiste o deserto
como uma chapada de verdade,
que o mesmo sentiste quando olhaste o mar,
não com olhos de ver, mas com olhos de aceitar.
Confessa as noites em que o céu estrelado
se dobra sobre a tua cabeça,
parecendo-te uma coisa tão bela quanto aterradora,
porque aquela constelação imensa de astros
é deus a escarrar a nossa ínfima condição.

Manuel Henrique Bento Fialho. A dança das feridas. Edição do autor. Portugal, 2011. 

Recebo de Portugal A dança das feridas, de que tomei conhecimento pelo blog antologia do esquecimento, administrado pelo poeta que me enviou o livro. Aqui é possível encontrar uma breve apresentação do livro e de sua proposta pelo autor, e o índice revela  tratar-se de poemas de amor entre casais pertencentes a diferentes circuitos culturais e artísticos, tendo em comum a civilização ocidental. É um livro que exige, portanto, os bastidores desses circuitos (ou os circuitos desses bastidores), e que pede uma leitura meditada. Como tal, a proposta se distingue pela originalidade com que aborda o amor, encenando-o com uma versatilidade admirável, do carnal ao espiritual. Portanto, este post é apenas uma apresentação ligeira e meu agradecimento ao Henrique, que se dispôs a enviar o livro antes mesmo que fosse acordada a forma de reembolso dos valores. É que o desejo de adquirir determinados livros vale a poesia que eles têm a oferecer. No caso específico, trata-se de uma edição limitada a 150 exemplares, únicos, autografados conforme queira o leitor, e que ainda podem ser adquiridos através do e-mail universosdesfeitos@yahoo.com.br. Ao Henrique, meu obrigada e meu abraço transatlântico. Voltarei aos poemas com mais vagar, explorando outras facetas desse estranho sentimento chamado amor. 

cena clássica de Butch Cassidy and the Sundance Kid (1969)


Butch Cassidy é um faroeste que despe a violência típica do gênero colocando no lugar dois bonitões simpáticos que  assaltam bancos e trens, e conseguem manter a amizade mesmo amando a mesma mulher, que parece preferir o charme de Butch (Paul Newman) mas namora o valentão Sundance (Robert Redford). Os dois, aliás, são o grande trunfo do filme. Sua fuga incansável apenas confirma a sintonia e a amizade. O final em grande estilo sugere uma espécie de moral para a história, que parece ser antes a história de dois homens charmosos e sagazes que roubam pelo prazer de fazê-lo: são ladrões profissionais, ou profissionais do crime. O filme vale pelos bonitões e pelas tiradas de humor, até a última cena. Segundo o livreto da Cinemateca Veja, quando foi lançado o filme não obteve críticas positivas, mas foi um sucesso: rendeu, só nos EUA, perto de 500 milhões de dólares em valores atualizados: "Está entre as 100 maiores bilheterias de todos os tempos e foi uma das maiores na década de 1960 [...] 'Acho que Butch Cassidy fez sucesso porque tem a ver com homens cuja época estava chegando ao fim', arrisca Robert Redford. O fato é que o filme mostou um novo estilo de faroeste, com heróis bem-humorados e falíveis. Heróis que simplesmente resolvem fugir quando estão acuados." Difícil o dilema da mocinha do filme. Não menor o dilema dos que continuaram explorando o gênero. 

[imagem obtida aqui]

terça-feira, 8 de março de 2011

trecho de conversa: rebeldia

“[...] as nossas neuroses e fraquezas também são, além de imposições, gostos nossos, insistências do nosso coração rebelde a certas situações que a gente não suporta. Então, pagamos o preço, e reclamamos, que também faz parte desse pagamento.  É tudo muito confuso nessa vida...”

trecho de conversa: carnaval

Dito de uma amiga, acerca do feriado estendido do Carnaval: "Esperar o povo resolver que o ano começou, né? Fazer o quê?"