Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


terça-feira, 13 de julho de 2010

os quatro elementos: Fernando Pessoa e o esoterismo

“Apesar de ter afirmado não haver pertencido a qualquer Ordem Iniciática, o interesse de Fernando Pessoa por ocultismos pronunciou-se de diversos modos. Acreditava ‘na existência de mundos superiores ao nosso e de habitantes desses mundos, em experiências de diversos graus de espiritualidade, sutilizando-se até se chegar a um Ente Superior, que presumivelmente criou este mundo’. Este e outros preceitos de que tinha convicções são fundamentos da seita esotérica e magista, Ordem Rosacruz, de que foi simpatizante e estudioso. Resulta daí seu interesse por astrologia. Ergueu não só o mapa astrológico de Portugal, como também de seus três heterônimos, Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos. Em apontamentos deixados para servir de prefácio ao seu livro de poemas Ficções de interlúdio, o poeta aborda a influência dos quatro elementos (fogo, água, terra e ar) sobre todas as coisas e sobre a personalidade de Caeiro, para explicar sua existência: ‘Referem-se os astrólogos os efeitos em todas as cousas à operação de quatro elementos - o fogo, a água, o ar e a terra. Com este sentido poderemos compreender a operação das influências. Uns agem sobre os homens como a terra, soterrando-os e abolindo-os, e esses são os mandantes do mundo. Uns agem como o ar, envolvendo-os e escondendo-os uns dos outros, e esses são os mandantes do além-mundo. Uns agem sobre os homens como a água, que os ensopa e converte em sua mesma substância, e esses são os ideólogos e os filósofos, que dispersam pelos outros as energias da própria alma. Uns agem sobre os homens como o fogo, que queima neles todo o acidental, e os deixa nus e reais, próprios e verídicos, e esses sãos os libertadores. Caeiro teve essa força. Que importa que Caeiro seja de mim, se assim é Caeiro? Assim operando sobre Reis, que ainda não havia escrito alguma cousa, fez nascer nele uma forma própria e uma pessoa estética. Assim operando sobre mim mesmo, livrou-me de sombras e farrapos, deu-me mais inspiração à inspiração e mais alma à alma. Depois disso, assim prodigiosamente conseguido, quem perguntará se Caeiro existiu?’

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