Há gente que se
gasta
de dentro para fora,
e há gente que
prefere
gastar-se no que
choca:
nesta pertence
aquela
sempre
vertiginosa
que
parece habitar
num
corpo sobre rodas;
gente
que não consegue
parar
nenhuma hora
e
que assim se aproveita
de
toda sua corda
para
andar se atirando
contra
as coisas em volta,
talvez
com esperança
que
uma seja pistola.
Talvez,
é por prezar
o
mundo em que se mova
(a
espessura tranquila
de
uma coisa que pousa,
a
mansidão da coisa
que
aceita virar outra)
que
essa gente se atira
aos
trancos entre as coisas.
Não:
é porque ouviriam,
se
parassem uma hora,
a
voz da alma vazia
dobrando
dentro, morta,
a
voz que dobra em muitos
mas
que neles redobra
porque
dentro de crânios
vazíissimos,
de abóboda.
MELO NETO, João Cabral de. Serial e antes. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 1997, p.300-301.
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