A morte desafia as definições bem assentadas de
dicionário. Ela é um incômodo, um desconforto, um espinho fisgando a carne e afetando a alma. Uma dor, sobretudo, um fantasma rondando a lembrar que o fim de
todos é debaixo da terra, roídos por vermes e sem agasalho ou proteção em
noites de chuva. Alguma coisa da vida ou da consciência sobrevive à morte
física, orgânica, à morte do corpo? Se sim, haverá horror maior que morrer? Claro
que há: o catálogo de horrores desse mundo aquém-túmulo parece infindável e inesgotável,
mesmo porque a imaginação humana não cansa de buscar excitação em fantasias
macabras e aterrorizantes. Mas a morte não pertence ao domínio das
monstruosidades fabricadas pelo homem, que não obstante estão intrinsecamente
ligadas a ela. A morte, primariamente, pertence ao domínio da natureza. Não pode
ser evitada. E dói, como se fizesse parte da vida.
Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.
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