Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Antonio Carlos Secchin

Reunião 

Aqui estamos nós
unidos pelo sangue 
e dispersos pela vida. 
Sabemos de onde viemos, 
mas não sabemos nossa saída. 
De Antônio e Catarina 
herdamos gestos, sonhos, corpos e voz. 
Muito sabemos deles, 
e pouco sabemos de nós. 
Aqui estamos todos 
― tios, sobrinhos, primos, avós ―, 
corrente entre um ontem vivo 
e um amanhã apressado, 
frente a frente 
com o futuro que nos chama, 
cara a cara 
com a chama de um passado. 
Agora atravessamos juntos 
Cachoeiro de ItapeSecchin, 
esta estrada tropical da Itália 
que desemboca em você e em mim. 
E se recompondo o que nós fomos 
este instante cintilar dentro de nós 
num sopro que a vida não apaga 
mesmo sozinhos não estaremos sós. 


Cachoeiro, 13/11/1999

SECCHIN, Antonio Carlos. Todos os ventos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2002, p.59-60.  

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