Ouvi falar do filme Incêndios numa entrevista da atriz Marieta Severo, quando comentava
a adaptação teatral da peça de mesmo nome, no teatro Poeira. A atriz enfatizava
de tal forma a força dramática da peça de que foi adaptado o filme que
não havia outro jeito senão assisti-lo. O filme, uma história trágica, é
desconcertante, e pede uma segunda visada. Há o contexto contemporâneo, um país
em guerra civil, e um fundo mitológico de que o espectador pode suspeitar ao
perceber as marcas feitas no pé de um recém-nascido, filho da protagonista, Nawal
Marwan, que dela será tirado e cuja busca acaba sendo o fio condutor da
trama, contada em dois planos, a busca dela e a busca de seus dois
filhos pelo passado enigmático que ela lhes lega no testamento. A cena inicial
de Incêndios traz o desamparo
estampado no rosto de meninos. Esse desamparo, ao final, vai justificar o
perdão possível.
Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.
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