Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


terça-feira, 21 de janeiro de 2014

liberdade

O mar me traz o que alcanço experimentar como paz. Pisar na areia é adentrar um território em que se desfruta de rara liberdade, inclusive sem perceber. Talvez seja disso, da sensação de liberdade, que venha a paz. Havia hoje uma espécie de bailado de pipas, de um esporte chamado kitesurfe. De repente percebi como estar nesse outro território é também quebrar a cadeia da percepção racional, para que outras coisas sejam vistas, sentidas. Foi assim que vi o bailado. Vi um homem que parecia estar andando em círculos. Mas não me detive nas pessoas. A liberdade que o mar oferece cria uma espécie de indiferença sagrada entre os que estão ali, como se todos fossem cultores de um deus que se confunde com o próprio altar, e que em vez de receber traz a oferenda, é essa própria oferenda. O pôr do sol foi deslumbrante, trazendo aos poucos tons maravilhosos para o céu e a água. E foi enquanto caminhava na beira do mar, ao pôr do sol, que vi duas meninas brincando de fugir das ondas que avançavam, aquele movimento de brincar com as margens ondeantes. Ali estava a liberdade, na fluidez imprecisa do mar, fazendo o corpo experimentar, sem perceber, uma fronteira inofensiva.

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