Em momentos de maior aflição, procuro Deus. Por
atavismo, começo a rezar o pai-nosso: “Pai nosso que estais no céu...” Mas dura
bem pouco minha intenção. Não consigo dizer “seja feita a Vossa vontade, assim na Terra como no Céu.” Se eu quisesse me
demitir de minha vontade, de meus desejos, seria outra minha vida, não estaria
aflita pelo que me aflige. Provavelmente eu seria outra, em perfeita comunhão
com Deus. O que é Deus? Quem é Ele? Isso a que chamam destino certamente se
impõe, está se desenhando em mim, vai além da morte. Por enquanto, tenho
a ilusão de que participo de sua caligrafia, pelo menos. E não quero chamar
Deus de Destino.
Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.
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