Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

trégua (ou recesso)

Esta é a melhor época do ano ― seu finzinho. Passou o frisson do Natal, aquela expectativa midiática toda em torno de uma ceia que poderia descambar em barracos natalinos. Sobreviveu-se aos próprios barracos, com um arranhão ou outro, que um bom vinho e o analista vão resolver. São cinco dias sagrados, entre 26 e 30 de dezembro, em que ainda se está em 2015 e ainda não é 2016. Uma adorável suspensão de (quase) tudo, que permite ao ser palmilhar a superfície das coisas, sem penetrá-las ou ser muito afetado por elas. Um mar caribenho em que não se vislumbra qualquer pontinha de iceberg desmancha-prazeres, porque o clima está ameno, agradável, está um clima metafórico. No dia 31 começará a contagem regressiva para o novo ano, o Ano Novo, e será dada a largada a uma nova maratona de sabe-se lá o que. Angústias, incertezas, previsões e notícias ruins, ataques, mortes violentas, a crise nossa de cada dia ― enfim, todo o rosário da desgraça humana a que Brás Cubas assistiu em seu célebre delírio. Mas, por enquanto, nesses breves cinco dias, vive-se o nirvana do tempo, um parêntese generoso nas (e das) solicitações, demandas e necessidades

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