Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


quinta-feira, 5 de agosto de 2010

João Alphonsus

A pedra no caminho

No meio do caminho sem sentido
Em que a minha retina se cansava,
Em face ao meu espírito perdido
Naquela lassidão estranha e escrava,

No meio do caminho sem sentido,
Só uma pedra... Nada mais se achava!
Que tudo se perdeu no amortecido,
Morto marasmo de vulcão sem lava...

Que tudo se perdeu na estrada infinda...
Só a pedra ficou sob o meu passo
E na retina se conserva ainda!

Nem coração, furor, ódio, carinho,
Nada restou senão este cansaço,
A pedra, a pedra, a pedra no caminho!

Folha da manhã, 25/10/1942 (conforme Bith)

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