Vi-me, em sonho, em território de Alice: pagando tributos em demasia, fazendo muitas reverências a Vossa Majestade. Os pronomes de tratamento não são aprendidos/ensinados impunemente: junto com eles apreende-se uma/a hierarquia. Mas, por outro lado, é uma maravilha poder aprender a língua, pois apreendem-se outras formas de dizer uma coisa, que é, quem sabe, dizer outra coisa. Então sonhei-me, confusamente, em território de Alice: havia reis e majestades, havia tirania, então entendi tratar-se do território de Alice. Mas dizer território de Alice é dizer de uma posse. Jamais posso me esquecer que ensinei isso aos alunos: “Vossa Onipotência ―” (assim, dessa forma, com um travessão em seguida) é o pronome de tratamento destinado a Deus, e não se usa, conforme a gramática que consultei, de Evanildo Bechara, abreviadamente, ao contrário dos demais, que admitem abreviatura. Deus seria tão vasto que não admitiria sequer ser sequestrado na/pela linguagem.
Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.
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