Voltava para casa no conforto do ônibus
que descia engrenado a serra, engrenado e firme, atributos que a passagem mais cara
comprou. Observava os veículos que ultrapassavam ― como, na soma das
velocidades, eles pareciam mais lentos do que estavam. Os modelos mais modernos
têm rodas cujo design dão uma estranha suavidade à impressão visual do
movimento: o carro desliza no asfalto, roda macio. Nunca entendi o fenômeno
físico envolvido na ilusão de ótica das rodas do carro, que parecem não estar
girando tão depressa quanto estão. O fato é que há muitos carros, macios ou
enferrujados, rodando ao mesmo tempo. É que a indústria automobilística do país
(montadoras) não pode parar, senão a economia desaquece e o desemprego sobe. E
como são muitos, indo na mesma direção, olhados à certa distância fazem lembrar
baratas.
Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.
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