Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


sábado, 30 de março de 2013

onde está a obra?

Em visita recente a um museu de arte contemporânea, feita um pouco sem itinerário, logo a primeira obra me causou uma sensação singular de susto e medo (sobre a obra há um comentário interessante aqui), e tudo o mais que tentei ver ficou impactado por essa experiência inicial, mesmo os trabalhos antológicos de Cildo Meireles, que revisitava, ou talvez porque os revisitasse. Porque, ao me encontrar sozinha na instalação ― o casal de amigos encontrava-se em outra ― eu de repente me assustei com os sons e ruídos daquele espaço constituído de barreiras físicas, que transmitiam, pelo menos a mim, uma sensação de clausura e desconhecimento. Eu não consegui perceber a obra, ou por não conseguir apreendê-la, ou por estar demais dentro dela. Então, ao juntar elementos soltos da sinopse lida rapidamente à entrada, pareceu-me, por não ter percebido a obra, que alguma coisa estranha e misteriosa ia acontecer, já que durante o curto intervalo de tempo em que me encontrei lá nada (ou quase nada) eu percebia como acontecendo, por exemplo alguém saltar do palco coberto para o espaço em que me encontrava. Só ruídos e sons num espaço pouco iluminado separado do exterior por sucessivas barreiras. Saí de lá o mais depressa que pude, assustada e ao mesmo tempo constrangida pelo sentimento de medo. Dentro da obra, eu não a vi, e me assustei com o descompasso entre o que prometia a sinopse e o que não consegui entrever ou perceber. Mesmo acompanhada, não quis voltar. 

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