“Mas tenho de manter a
minha fama de mau. O que desejo, no entanto, é tomar o 2 de Julho baiano deste
ano como exemplo do que deve ser o 7 de Setembro nacional. Li no Jânio deFreitas (...) palavras indignadas
com a agressão à emergência do Hospital Sírio-Libanês perpetrada pelos grupos
violentos que se tornaram um lugar-comum do estágio final de cada passeata. Já
me referi aqui à arriscada simplificação que a mídia faz quando separa os
protestos, que começam pacíficos, dos atos de ‘vandalismo’ que em geral a eles
se seguem: muita gente que não joga pedra se sente representado por quem joga —
e muitos dos que saem sem esse intuito muitas vezes aderem, no calor da hora,
aos atos agressivos. Todos sabem (a Globo mostrou os vídeos da Mídia Ninja) que
a incitação à barbárie por vezes parte de policiais infiltrados e disfarçados (...).
Mas as depredações de bancos e butiques responde a uma raiva anticapitalista
que é parte do impulso político que fez nascer as manifestações. Também às
formas meio filosóficas, meio literárias de expressão de tal sentimento
engendradas por leitores de Deleuze e Foucault, como Antonio Negri e Michael
Hardt (...). Seja como for, um 7 de Setembro violento seria uma burrice. Meu
colega Sidney Waismann me procurou para propor algum gesto público que
prevenisse a hecatombe que o artigo de Jânio de Freitas esboça (a partir do que
leu em redes sociais). Sidney sugere chamar Zuenir, Alba Zaluar, Francisco
Bosco, quem sabe companheiros músicos e outros criadores e pensadores, e pedir
audiência com Beltrame. Por outro lado, expor aos manifestantes a questão não
formulada: a violência é mais eficaz? Ele lembrou que Zuenir evoca Gandhi,
Luther King e Mandela como exemplos. Se sairmos pela paz na Independência, o
país lerá concentradamente a pergunta “Cadê Amarildo?” e tentará respondê-la. O
mundo passa por convulsão. Nós precisamos de sabedoria. Dizer que passeata
pacífica é armação da mídia golpista é pobreza que ajudará os piores argumentos
dos reacionários. O artigo de Francisco Bosco foi iluminador. Para mim,
violência no 7 de Setembro seria simplesmente burrice.”
Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.
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