Aconteceu no ponto de ônibus. Que, no Rio de Janeiro,
dependendo do bairro, é também ponto das vans. As vans trabalham em geral com
um trocador, que vai cantando o destino à medida que passa nos pontos. Por
exemplo: “sulacap-taquara-recreio” — a que se costuma acrescentar: “vaga sentado”.
Tudo isso prolongando o “o” de sentadooo. Talvez seja impossível reproduzir em
palavras o pequeno chiste que o inusitado de uma situação ensejou. Um gari
dependurado no carro de coleta de lixo passou no ponto cantando um destino
qualquer das vans, não esquecendo a “vaga sentadooo”. Naturalmente se ele,
depois de um dia pesado de trabalho, tinha disposição para brincar com os
passageiros também cansados que aguardavam no ponto, por que não retribuir? E,
de fato, ficou engraçado, algumas pessoas riram, talvez pela surpresa de alguém
extrair humor do que comumente é opaco.
Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.
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