Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Dora Ferreira da Silva

A RECLUSA

Entre as irmãs
és tu ― Emily ―
que vejo no jardim:
cachos de cobre
rosto concentrado
um pouco velho e sóbrio
fronte silenciosa
mesmo quando falamos
de irreais amores
como de nossas flores.

Entre nós um girassol equilibra
luas diurnas
nebulosas e primroses
(tua preceptora noturna
poderia quem
sabe colhê-las mais tarde
a foice oculta nos refolhos.)

Pássaro magro
vens de algodãozinho verde
com rendas cor de creme
(pobre com ar de nobre).
Prendo-te violetas à cintura
rimos contentes
e corremos para escapar
à chuva de verão.

Dora Ferreira da Silva. Poesia reunida. Rio de Janeiro: Topbooks, 1999, p.138-139.

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