Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

e. e. cummings em tradução de mário faustino

― Piedade para esse monstro atarefado, inumanidade

― não. O Progresso é doença confortável:
a vítima (morte e vida mantidas a uma distância conveniente)

brinca com a grandeza de sua pequeneza
― elétrons deificam uma lâmina de barbear
transformando-a em cadeiademontanha; lentes estendem
nãodesejo através de coleante ondequando
até que nãodesejo
se volta sobre si nãomesmo.
                                      Mundo de feito
não é mundo de nascido ― piedade para a pobre carne

e para as árvores, pobres estrelas e pedras, nunca para este
ótimo espécime de hipermágica

ultraonipotência. Nós médicos sabemos

que um doente está desenganado quando... escuta aqui:
tem um universo bom como o diabo aí do lado; vambora

FAUSTINO, Mário. Poesia completa e traduzida. Org. Benedito Nunes. São Paulo: Max Limonard, 1985, p.289. Poema original e versão de Augusto de Campos AQUI.

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