Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


terça-feira, 10 de setembro de 2013

vício

Os médicos, ao longo dos anos, foram me cortando vários pequenos prazeres do paladar, quando não fui eu mesma que me adiantei. Cada um tinha sua explicação — a ATM (disfunção da articulação temporomandibular), o fígado, o colesterol, por fim o labirinto. Saíram da mesa, mais ou menos nessa ordem, o café, a cerveja, o vinho, o chocolate, o capuccino, o licor... Substituí o chocolate pela canela, no leite, e ficou saboroso. Mas é pouco para tantos sabores que foram subtraídos. Então eu reabilitei o café, expulso há pelo menos vinte anos, porque se trata de poder ter algum vício, e o fiz em grande estilo, porque, já que é um vício, que seja um vício decente.

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