O trânsito dessa cidade está muito ruim — péssimo é o
termo adequado. E sua propalada beleza, fonte de divisas na exploração do
turista, anda sofrendo reveses. Há seis anos, quando vinha fazer pesquisas para
a tese na Biblioteca Nacional, sem imaginar que em breve iria transferir minha
vida para cá, apaixonei-me pelo centro da cidade, a arquitetura preservada do
tempo do Império, a elegância da Rio Branco. Mas a geografia do centro do Rio
mudou bastante após o fenômeno das manifestações. Agora os tapumes dominam a
fachada das agências bancárias, bem como de alguns órgãos públicos, e não há
redenção para tamanho mau gosto. Quem te
viu, quem te vê, diria talvez Chico Buarque, se estivesse pontificando na
cena política. O centro do Rio está feioso, perdeu o charme, a elegância da
arquitetura combinada ao traço moderno. No Rio pós-moderno a política tem
deixado dois rastros de destruição: um oficial, configurado no bota-abaixo do furor
obreiro da prefeitura, em conluio com as esferas estadual e federal; um não
oficial, fruto da violência das manifestações, inclusive contra os mandatários
das obras.
Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.
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