Sobre o Paradoxo de Fermi, AQUI.
Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.
quarta-feira, 31 de dezembro de 2014
fé
Eu estava
precisando de Deus
— Então choveu.
Depois, mais
Nada.
Frágil chuva de
verão
A cair nos
desertos da fé.
sábado, 27 de dezembro de 2014
quinta-feira, 25 de dezembro de 2014
quarta-feira, 17 de dezembro de 2014
fim de ano
José Simão diz que a mensagem de fim de ano no
Brasil precisa mudar: “Feliz Natal ou Próspero Ano Novo.” Os dois juntos não dá.
sábado, 6 de dezembro de 2014
Paulo Francis, jornalismo e metáforas
O
lugar-comum, equivocado, de que roupa branca suja mais poderia servir de farol
para desmascarar o oportunismo que vem tomando conta de uma oposição pouco
séria que quer posar de mocinho, ou mesmo mocinha. A corrupção não é maior
agora que nos governos precedentes: está aparecendo mais. As metáforas do que
está sendo chamado pela imprensa de Petrolão podem servir de norte: Operação
Lava Jato.
“O jornalista Franz Paul
Heilborn, que assinava sua coluna nos jornais e se apresentava na TV como Paulo
Francis, morreu menos de um mês depois de ser informado por seus advogados de
que não tinha como se defender no processo movido pela Petrobras na corte de
Nova York. Como havia acusado sem provas, baseado em fontes que não podia
revelar, entrou em depressão e sofreu um estresse que causou sua morte por um
ataque cardíaco, segundo revelou sua mulher, a jornalista e escritora Sonia
Nolasco. A
lembrança de sua denúncia vem agora assombrar antigos dirigentes da empresa
petroleira e colocar a imprensa brasileira diante de um dilema: se persistir em
circunscrever o escândalo aos fatos recentes, datando o processo a partir do
ano 2013, o noticiário ficará marcado pelo partidarismo e a manipulação. Se for
investigar as origens do escândalo, completando a pauta levantada por Paulo
Francis há 17 anos, terá que reconhecer que a corrupção na Petrobras tem raízes
mais profundas, e estará aberto o caminho para uma operação de larga escala
contra a roubalheira. O ponto de partida dessa pauta é sua afirmação de que, em
1997, diretores da Petrobras engordavam contas bancárias na Suíça com dinheiro
de propinas obtidas na compra de equipamentos.” (Observatório da Imprensa)
quarta-feira, 3 de dezembro de 2014
terça-feira, 18 de novembro de 2014
domingo, 16 de novembro de 2014
sábado, 8 de novembro de 2014
segunda-feira, 27 de outubro de 2014
sábado, 25 de outubro de 2014
sábado, 18 de outubro de 2014
terça-feira, 30 de setembro de 2014
quinta-feira, 18 de setembro de 2014
quinta-feira, 28 de agosto de 2014
violência nas escolas
Pesquisa põe Brasil em topo de ranking de violência contra professores
(aqui).
domingo, 3 de agosto de 2014
terça-feira, 29 de julho de 2014
quinta-feira, 24 de julho de 2014
terça-feira, 22 de julho de 2014
domingo, 20 de julho de 2014
Emily Dickinson
Deus tudo fez por um motivo,
E um plano deu às almas,
Nossa inferência é prematura,
Nossas premissas falsas.
God made no act without a
cause,
Nor heart without an aim,
Our inference is premature,
Our premises to blame.
DICKINSON, Emily. A branca voz da solidão. Trad. José Lira.
São Paulo: Iluminuras, 2011, p.154-155.
sexta-feira, 11 de julho de 2014
quarta-feira, 9 de julho de 2014
sexta-feira, 4 de julho de 2014
terça-feira, 1 de julho de 2014
segunda-feira, 16 de junho de 2014
segunda-feira, 2 de junho de 2014
sexta-feira, 30 de maio de 2014
a dimensão da dor
[...]
Será maior a tua dor
que a daquele gato que viste
a espinha quebrada a pau
arrastando-se a berrar pela sarjeta
sem ao menos poder morrer?
Ferreira Gullar. Toda
poesia. 19.ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2010, p.295.
segunda-feira, 19 de maio de 2014
terça-feira, 13 de maio de 2014
som, silêncio e ruído
A música ruim violenta o
silêncio. Mas não é possível dizer o que significa "música ruim" para
cada um.
sexta-feira, 9 de maio de 2014
terça-feira, 6 de maio de 2014
sábado, 26 de abril de 2014
eu!?
Tenho momentos de extrema fragilidade, em que parece
que vou desintegrar, que o eu que construí para uso externo e contínuo vai
ceder à emergência de forças disciplinarmente mantidas sob controle, sob
vigilância atenta. Entrevejo outros eus, passados e presentes, e pressinto que
a casca frágil da superfície pode facilmente rebentar. Meus recursos nesses
momentos? Escrever, por exemplo. Outros
são de foro íntimo.
quinta-feira, 24 de abril de 2014
quarta-feira, 23 de abril de 2014
Murilo Mendes
JUÍZO FINAL DOS OLHOS
Teus olhos vão ser julgados
Com clemência bem menor
Do que o resto do teu corpo.
Teus olhos pousaram demais
Nos seios e nos quadris,
Eles pousaram de menos
Nos outros olhos que existem
Aqui neste mundo de Deus.
Eles pousaram bem pouco
Nas mãos dos pobres daqui
E nos corpos dos doentes.
Teus olhos irão sofrer
Mais que o resto do teu corpo:
Eles não poderão ver
As criaturas mais puras
Que no outro mundo se vê.
MENDES,
Murilo. Poesia completa e prosa. Rio
de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, p.205.
poesia
“Devo aos poetas de
todos os tempos a sobrevivência de minha alma. [...] A Baudelaire, em cujo
túmulo depositei uma rosa, a fulgurância do raciocínio, a elegância corrosiva
de seu sentimento trágico; a Shakespeare, a iniciação a todas formas humanas
[...]. A Pablo Picasso, a reacomodação do nervo óptico.”
Paulo Mendes Campos. Cisne de feltro. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2001, p.18.
terça-feira, 22 de abril de 2014
Paulo Henriques Britto: "Nem tudo que fui se aproveita"
QUEIMA DE
ARQUIVO
Houve um tempo em que eu amava
em cada corpo o reflexo
do que eu queria ter sido.
No fundo do sexo eu buscava
o meu desejo perdido.
Acabei achando o outro
que em mim mesmo destruí.
Foi fácil reconhecê-lo:
de tudo que vi em seu rosto
somente o ódio era belo.
Esse morto adolescente
implacável e virginal
não me perdoa a desfeita.
Não faz mal. Eu sigo em frente.
Nem tudo que fui se aproveita.
Paulo Henriques Britto. Mínima lírica. 2.ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2013,
p.80.
segunda-feira, 21 de abril de 2014
páscoa
Tive uma páscoa
maravilhosa, sem precisar de chocolate — e sem precisar lembrar que era páscoa.
quarta-feira, 16 de abril de 2014
cansaço
No cansaço do final do dia —
E é sempre um cansaço denso —
Surge no horizonte a poesia
Trazendo à noite outro tom de intenso.
domingo, 13 de abril de 2014
Manuel Bandeira
A ESTRELA
Vi uma estrela tão alta,
Vi uma estrela tão fria!
Vi uma estrela luzindo
Na minha vida vazia.
Era uma estrela tão alta!
Era uma estrela tão fria!
Era uma estrela sozinha
Luzindo no fim do dia.
Por que da sua distância
Para a minha companhia
Não baixava aquela estrela?
Por que tão alta luzia?
E ouvi-a na sombra funda
Responder que assim fazia
Para dar uma esperança
Mais triste ao fim do meu dia.
Vi uma estrela tão fria!
Vi uma estrela luzindo
Na minha vida vazia.
Era uma estrela tão alta!
Era uma estrela tão fria!
Era uma estrela sozinha
Luzindo no fim do dia.
Por que da sua distância
Para a minha companhia
Não baixava aquela estrela?
Por que tão alta luzia?
E ouvi-a na sombra funda
Responder que assim fazia
Para dar uma esperança
Mais triste ao fim do meu dia.
BANDEIRA, Manuel. Estrela da vida inteira. 20.ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1993, p.174.
quarta-feira, 9 de abril de 2014
sábado, 5 de abril de 2014
Milguel Marvilla
INSTANTE
Estamos ressurgindo.
Estou aberto
e pleno neste instante irrepetível.
O mundo
acontece, estou vivo,
preparo minha
permanência:
repito meu
papel mil vezes diante do espelho.
Acompanho a
linha que meus olhos produzem à cata
de uma
estrela há muito morta
e sei que
sou, de novo, real.
Este brilho
em teu olhar, no entanto, instaura a dúvida:
um de nós
é sonho. Mas qual?
Miguel Marvilla.
Lição de labirinto. Vitória: Fundação
Ceciliano Abel de Almeida, 1989, p.87.
terça-feira, 1 de abril de 2014
"escravos de jó", canção censurada do álbum "milagre dos peixes", gravada posteriormente como "caxangá" por elis regina
Milton Nascimento e Fernando Brant
Sempre no coração
haja o que houver
a fome de um dia poder
morder a carne dessa mulher
Veja bem meu patrão
como pode ser bom
você trabalharia no sol
e eu tomando banho de mar
Luto para viver
vivo para morrer
enquanto a minha morte não vem
eu vivo de brigar contra o rei
Em volta do fogo
todo o mundo abrindo jogo
conta o que tem pra contar
casos e desejos
coisas dessa vida e da outra
mas nada de assustar
quem não é sincero
sai da brincadeira correndo
pois pode se queimar, queimar
Saio do trabalh-ei
volto pra cas-ei
não lembro de canseira maior
em tudo é o mesmo suor
Murilo Mendes
A VISIBILIDADE
Passar ignorado dos homens, das palavras,
Ignorado das águas, do demônio,
Ignorado dos personagens da história,
Ignorado até de Deus,
Até dos pássaros, das pedras.
Mas a luz se desfaz em vaia.
Os demônios mostram o seio em arco
— Arco de sua vitória exclusiva —,
As águas exigem um carinho,
Do contrário te afogarão.
As pedras exigem teu amor
— Vives em cima delas —
Do contrário te apedrejarão,
Apedrejarão
Quem quiser viver no ar.
MENDES, Murilo. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, p.233.
segunda-feira, 31 de março de 2014
Paul Géraldy
MEDITAÇÃO
A gente
começa a amar
Por simples curiosidade,
Por ter lido num olhar
Certa possibilidade.
Por simples curiosidade,
Por ter lido num olhar
Certa possibilidade.
E como, no
fundo, a gente
Se quer muito bem,
Ama quem a ama somente
Pelo gosto igual que tem.
Se quer muito bem,
Ama quem a ama somente
Pelo gosto igual que tem.
Pelo amor
de amar começa
A repartir dor por dor.
E se habitua depressa
A trocar frases de amor.
A repartir dor por dor.
E se habitua depressa
A trocar frases de amor.
E, sem
pensar, vai falando
De novo as que já falou…
E então continua amando
Só porque já começou.
De novo as que já falou…
E então continua amando
Só porque já começou.
Poetas de França. Trad. Guilherme de Almeida. 5.ed.
São Paulo: Babel, s/d, p.161.
domingo, 30 de março de 2014
o poder
Michel Foucault.
— Esta dificuldade — nosso embaraço em encontrar as formas de luta adequadas —
não virá de que ainda ignoramos o que é o poder? Afinal de contas, foi preciso
esperar o século XIX para saber o que era a exploração, mas talvez ainda não se
saiba o que é o poder. E Marx e Freud talvez não sejam suficientes para nos
ajudar a conhecer esta coisa tão enigmática, ao mesmo tempo visível e
invisível, presente e oculta, investida em toda parte, que se chama poder. A
teoria do Estado, a análise tradicional dos aparelhos de Estado sem dúvida não
esgotam o campo de exercício e de funcionamento do poder. Existe atualmente um
grande desconhecido: quem exerce o poder? Onde o exerce? Atualmente se sabe,
mais ou menos, quem explora, para onde vai o lucro, por que mãos ele passa e
onde ele se reinveste, mas o poder... Sabe-se muito bem que não são os
governantes que o detêm. Mas a noção de "classe dirigente" nem é
muito clara nem muito elaborada. "Dominar", "dirigir", "governar",
"grupo no poder", "aparelho de Estado", etc., é todo um
conjunto de noções que exige análise. Além disso, seria necessário saber até
onde se exerce o poder, através de que revezamentos e até que instâncias, frequentemente
ínfimas, de controle, de vigilância, de proibições, de coerções. Onde há poder,
ele se exerce. Ninguém é, propriamente falando, seu titular; e, no entanto, ele
sempre se exerce em determinada direção, com uns de um lado e outros do outro;
não se sabe ao certo quem o detém; mas se sabe quem não o possui.
sábado, 29 de março de 2014
a aula inaugural de clarice
“À fraternidade e solidariedade dramatizadas na
literatura oitocentista, Clarice erige o lugar
da solidão como o laboratório experimental onde se pode melhor trabalhar as
injustiças da sociedade contemporânea, envolvendo os materiais de trabalho —
homens e coisas em estado de palavra — num clandestino amor.” Silviano Santiago, “A aula inaugural de
Clarice”.
quinta-feira, 27 de março de 2014
asterismo
Já me disseram que eu complico demais as coisas...
Fazendo uma analogia para traduzir a ingenuidade do pensamento, considere-se o
jogo de ligar os pontos. Há os que têm menos pontos a unir, ou os pontos estão
dispostos de forma tal a dar rapidamente uma figura reconhecível ou dominável
pelo imaginário. Eu tenho mais, muitos aliás, pontos a unir, e eles não chegam
a formar uma figura, muito menos com sentido facilmente reconhecível — pelo
menos até agora.
quarta-feira, 26 de março de 2014
segunda-feira, 24 de março de 2014
a palavra "desejo"
CHAUÍ, Marilena. Laços do desejo. In: NOVAES, Adauto (Org.).
O desejo. São Paulo: Companhia das Letras, 1990, p.22-23.
domingo, 23 de março de 2014
sábado, 22 de março de 2014
mar – gens
Cuspi na zona de espraiamento — aquela parte mágica da
praia em que se caminha molhando a pequenos intervalos os pés —, e fiquei
esperando a onda que viria integrar aquela parte desprezível de mim ao suco
salgado do mar.
Manuel Bandeira
A LUA
A proa reta abre no oceano
Um tumulto de espumas pampas.
Delas nascer parece a esteira
Do luar sobre as águas mansas.
O mar jaz como um céu tombado.
Ora é o céu que é um mar, onde a lua,
A só, silente louca, emerge
Das ondas-nuvens, toda nua.
BANDEIRA, Manuel. Estrela da vida
inteira. 20.ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993, p.238.
sexta-feira, 21 de março de 2014
quinta-feira, 20 de março de 2014
quarta-feira, 19 de março de 2014
Carlos Pena Filho
SONETO DAS DEFINIÇÕES
Não falarei das coisas, mas de inventos
e de pacientes buscas no esquisito.
Em breve, chegarei à cor do grito
à música das cores e dos ventos.
Multiplicar-me-ei em mil cinzentos
(desta maneira, lúcido, me evito)
e a estes pés cansados de granito
saberei transformar em cataventos.
Daí, o meu desprezo a jogos claros
e nunca comparados ou medidos
como estes meus, ilógicos, mas raros.
Daí também, a enorme divergência
entre os dias e os jogos, divertidos
e feitos de beleza e improcedência.
Os melhores poemas de Carlos Pena Filho. 4.ed. são Paulo:
Global, 200, p.91.
terça-feira, 18 de março de 2014
Paulo Henriques Britto
Dentro da noite que construo aos
poucos
para meu próprio uso, tudo é sombra
em que repouse a vista, salvo a lua
eventual, que me ilumine o espaço
que falta eliminar e meça o tempo
em que me esqueço a contemplar o
tédio
que descasco e rejeito, em que
dispenso
a luz do dia, excesso que não quero
ou não mereço, luxo que desprezo
sem sombra de arrependimento ou
luto.
Aqui onde me resto tudo é meu
e mudo, e a noite me cai muito leve
sobre os ombros frios, como um manto,
ou como
um outro pano mais definitivo.
Paulo Henriques Britto. Mínima lírica. 2.ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2013,
p.27.
domingo, 16 de março de 2014
Emily Dickinson
Cirurgiões
precisam ter cautela
Com
sua lâmina afiada –
Por sob as finas incisões se agita
A Vida – essa Culpada!
Surgeons
must be very careful
When
they take the knife!
Underneath
their fine incisions
Stirs the Culprit – Life!
DICKINSON, Emily. Alguns poemas. Trad. José Lira. São Paulo: Iluminuras,
2008, p.240-241.
sábado, 15 de março de 2014
Stéphane Mallarmé
A TUMBA DE EDGAR POE
Tal que a Si-mesmo enfim a Eternidade o guia,
O Poeta suscita com o gládio erguido
Seu século espantado por não ter sabido
Que nessa estranha voz a morte se insurgia!
O Poeta suscita com o gládio erguido
Seu século espantado por não ter sabido
Que nessa estranha voz a morte se insurgia!
Vil sobressalto de hidra ante o anjo que urgia
Um sentido mais puro às palavras da tribo,
Proclamaram bem alto o sortilégio atribu-
Ído à onda sem honra de uma negra orgia.
Um sentido mais puro às palavras da tribo,
Proclamaram bem alto o sortilégio atribu-
Ído à onda sem honra de uma negra orgia.
Do solo e céu hostis, ó dor! Se o que descrevo —
A ideia só — não esculpir baixo-relevo
Que ao túmulo de Poe luminescente indique,
A ideia só — não esculpir baixo-relevo
Que ao túmulo de Poe luminescente indique,
Calmo bloco caído de um desastre obscuro,
Que este granito ao menos seja eterno dique
Aos voos da Blasfêmia esparsos no futuro.
Que este granito ao menos seja eterno dique
Aos voos da Blasfêmia esparsos no futuro.
Mallarmé.
Trad. Augusto de Campos. 4.ed. São Paulo: perspectiva, 2010, p.67.
quinta-feira, 13 de março de 2014
Emily Dickinson
No
fim nos guia a Experiência –
Sua acerba amizade
Não há de dar a um Axioma
Uma Oportunidade
Experiment escorts us last –
His pungent company
Will not allow an Axiom
An Opportunity
DICKINSON, Emily. A branca voz da solidão. Trad. José Lira.
São Paulo: Iluminuras, 2011, p.158-159.
domingo, 9 de março de 2014
chove...
CANTIGAS
ESQUECIDAS – III
Paul Verlaine
Chora no meu coração
Como chove na cidade;
Qual será tal lassidão
Entrando em meu coração?
Como chove na cidade;
Qual será tal lassidão
Entrando em meu coração?
Ó doce rumor da chuva
Pela terra e sobre os tetos!
Coração que se enviúva,
Ó, a cantiga da chuva!
Pela terra e sobre os tetos!
Coração que se enviúva,
Ó, a cantiga da chuva!
Chora sem qualquer
razão
No coração que se enfada,
Pois! Nenhuma traição?…
Este luto é sem razão.
No coração que se enfada,
Pois! Nenhuma traição?…
Este luto é sem razão.
É bem certo a pior dor
A de não saber por quê
Sem amor e sem rancor
Coração tem tanta dor!
A de não saber por quê
Sem amor e sem rancor
Coração tem tanta dor!
Tradução José Lino Grünewald. Disponível aqui.
Chove. Há silêncio, porque a mesma chuva
Não faz ruído senão com sossego.
Chove. O céu dorme. Quando a alma é viúva
Do que não sabe, o sentimento é cego.
Chove. Meu ser (quem sou) renego...
Tão calma é a chuva que se solta no ar
(Nem parece de nuvens) que parece
Que não é chuva, mas um sussurrar
Que de si mesmo, ao sussurrar, se esquece.
Chove. Nada apetece...
Não paira vento, não há céu que eu sinta.
Chove longínqua e indistintamente,
Como uma coisa certa que nos minta,
Como um grande desejo que nos mente.
Chove. Nada em mim sente...
Fernando
Pessoa. Poesia 1931-1935. São Paulo: Companhia
das Letras, 2009, p.199-200.
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