“Desumanidade e grosseria deixar de enviar algumas linhas ao rapaz. Refletindo, lembrei-me de que não nos tínhamos obrigado. Capitão Lobo apenas afirmara que nos comprometíamos. Uma ordem, somente. Se decidíssemos transgredi-la? De qualquer modo havia um acordo tácito ― e aí notei pela primeira vez um dos horrores sutis em que é fértil a cadeia: pretendem forçar-nos, sob palavra, a ser covardes. A princípio não distinguimos a cilada. ― ‘Está ali um sujeito com quem o senhor não se pode entender.’ ― ‘Perfeitamente.’ Aceitamos a imposição sem divisar nenhuma inconveniência. Mais tarde um infeliz nos abre a alma e hesitamos em solidarizar-nos com ele. Haverá maior covardia? Obedeceremos à frase a que não demos a necessária atenção ou escutaremos a voz interior?”
RAMOS, Graciliano. Memórias do cárcere. 44.ed. Rio de Janeiro: Record, 2008, p.98.
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