Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

um pequeno milagre

Hoje, já praticamente de férias, e sem nada marcado que me obrigasse a sair de casa, voltei para a cama pela manhã e, para minha surpresa, simplesmente dormi até quase meio dia, ainda que a rua estivesse ruidosa. Surpresa porque eu nunca consigo dormir pela manhã ― acordo cedo, como quem tem um galo interior que obriga a despertar sempre no mesmo horário, e dificilmente consigo voltar a dormir. Costume antigo, herdado da roça e da criação rígida. Hoje o dia estava diferente, e eu dormi um sono merecido, um descanso que é, sobretudo, do corpo. No final da tarde, a velha e boa sessão de análise. Relatei o ocorrido, e o inusitado sonho que tive durante o sono extemporâneo. Um pouco entendi do sonho. Muito do que disse na sessão girou em torno de outras questões, questões difíceis, para concluir que uma parte expressiva da vida me(nos) escapa. Meu corpo está pedindo trégua ― qualquer excesso me cansa, e o que chamo de excesso teve seu limiar reduzido nos últimos tempos. O corpo é o campo de batalhas onde os embates da vida acontecem. Felizmente posso escrever isso ― ajuda a descansar.

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