O TIGRE
O tigre, segundo Valéry, é um fato grandioso, uma vera instituição, um poder organizadíssimo, uma espécie de razão do estado, de monarquia totalitária; o animal absoluto. Por estes e outros motivos afins já se vê que le tigre ce n’est pas moi.
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O tigre, mamífero (sic) da família real dos Felídios, calcula seus atos com rigor extremo; não se passa a limpo, não se desdiz, nem se corrige. O tigre é autocronometrado. Mesmo quando opera durante a noite opera diurno.
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William Blake maravilha-se com razão, perguntando-se que olho imortal ousou a terrível simetria do tigre; e se o tigre poderia agradar ao próprio Deus que criou o Cordeiro.
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O tigre devorará tua metáfora antes do seu acabamento. O tigre não espera o homem. Os deuses esperam o tigre.
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O tigre, compasso em forma de tigre.
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Não há tigre vice: o leão é vice-tigre.
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O tigre: tão bem organizado que até os tigres de papel fazem-se tremer.
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Agredirei a majestade desse animal definitivo, aludindo à tigricidade da dupla Stalinhitler?
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O tigre, esse cosmotigre.
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O tigre é belo. Inadiável. Sibilino. Calmo. Intransferível.
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A tigresa eternidade avança para mim sob a forma de uma tesoura: Átropos.
MENDES, Murilo. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, p.981.
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