Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


domingo, 4 de março de 2012

Rainer Maria Rilke: Sonetos a Orfeu

I.19

Mesmo que o mundo mude velozmente,
como nuvens num mosaico,
tudo o que é perfeito tende
de volta ao arcaico.

Sobre a mudança e o andar,
ampla e livre, inda perdura
tua voz que vibra no ar,
ó Deus da lira pura!

Nem a dor aqui se encerra,
nem do amor sabemos a sorte;
nem o temor do exílio da morte,

nada disso está desvendado.
Somente o canto na terra
será santo e celebrado.

RILKE, Rainer Maria. Os sonetos a Orfeu. Elegias de Duíno. Trad. Karlos Rischbieter e Paulo Garfunkel. Rio de Janeiro: Record, 2002, p.50-51.

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