Hoje, no Centro, já anoitecendo,
um homem, batedor de carteira, corria em disparada, quando caiu violentamente
no meio da rua e foi dominado por dois policiais, que mediam velocidade com ele
em perseguição desatinada. Os transeuntes pareciam extasiados com a cena. Ouvi
o baque de seu corpo de encontro ao chão. Enquanto isso, as lojas de roupas
femininas estampavam liquidação com preços de três dígitos antes da vírgula. Na
troca de turno dia/noite das ruas do Centro, aos poucos foram rareando os
frequentadores habituais ― exceto nos pontos de happy hour ― e começando a ganhar evidência catadores de papel e
moradores de rua ― criaturas da noite, lembrando o título de uma
canção cujo lirismo passa distante desse mundo desencantado.
Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.
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