Começar um texto ― a dizer alguma coisa ―pela negação é o modo de ser mais fiel às formas de representação de um
dado saber. Porque a negação é certa. Numa sessão de análise, quantos silêncios
rodeando a necessidade de (não) dizer!, o que não deixa de justificar o ritual.
Há uma ideia prévia de fala. E, no entanto, o que é dito costuma passar longe.
Há diferentes formas de exposição de si que uma pessoa pode (ou não) considerar
aceitável. Um dos problemas da psicanálise é este: até que ponto a pessoa
suporta a exposição, e se o ritual funciona quando a exposição fica aquém de um
limiar qualquer que dispara o mecanismo da troca, ou transferência. Aqui,
mediante a palavra escrita, envolta numa aura de anonimato e nulidade, a
exposição é menos invasiva, mais contingente.
Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.
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