Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


terça-feira, 22 de março de 2011

angústia

Paciência é algo difícil de ser conjugado quando o bom senso é muito afrontado. Cai-se no risco da passividade. As coisas funcionam de forma estranha neste país, com variações de estado a estado. Ineficiência, lentidão, burocracia excessiva, feriados em demasia, e a sensação de correr contra o tempo, de que a própria vida está atrasada. Daí a sensação de angústia. Daí que é preciso agir, mas intuindo qual é a ação, que fornece uma espécie de limite: a intuição ilumina a ação, a ação é uma forma de colocar um limite ao que estava incomodando. Então hoje, depois de um desses bastas que têm o poder de catarse de um palavrão, vi numa banca de jornais, num daqueles jornalecos sensacionalistas cujo único fim é chocar, uma imagem tão grotesca, tão ofensiva à própria vida, que me assustei com os limites da vida, da ação, da inteligência, da intuição, do acaso, de tudo. Era, digamos assim, o meu rato (quem puder que entenda). Diante do grotesco, do monstruoso, primeiro emudecemos, dando um grito abafado pelo susto. Imediatamente se deseja fugir, pois nada parece fazer mesmo sentido. O monstruoso que ali via simplesmente me dava os limites da vida, e por isso assustava, pois as pessoas querem viver, e a travessia poderia ser um pouco mais suave. Mas os jornais insistem em gritar misérias todos os dias.

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