No post anterior, não escapa que a canção Lero-Lero tenha letra de Cacaso, talvez, junto com Torquato Neto, o mais corrosivo dos poetas marginais. Subjacente a uma melodia que pode sugerir certa displicência do brasileiro (e o vídeo da canção é de 79...), há um jogo sutil de ironias acerca do que era então esse personagem, em que avulta a voz da dissonância: "Eu sou poeta e não nego a minha raça / Faço versos por pirraça e também por precisão." Preciso. Ou melhor, incerto, não inserto. Pois é de Cacaso um dos mais irônicos poemas da época, publicado na primeira edição da antologia 26 poetas hoje (1975).
JOGOS FLORAIS
I
Minha terra tem palmeiras
onde canta o tico-tico.
Enquanto isso o sabiá
vive comendo o meu fubá.
Ficou moderno o Brasil
ficou moderno o milagre:
a água já não vira vinho,
vira direto vinagre.
onde canta o tico-tico.
Enquanto isso o sabiá
vive comendo o meu fubá.
Ficou moderno o Brasil
ficou moderno o milagre:
a água já não vira vinho,
vira direto vinagre.
II
Minha terra tem Palmares
memória cala-te já.
Peço licença poética
Belém capital Pará.
Bem, meus prezados senhores
dado o avançado da hora
errata e efeitos do vinho
o poeta sai de fininho.
(será mesmo com dois esses
que se escreve paçarinho?)
Peço licença poética
Belém capital Pará.
Bem, meus prezados senhores
dado o avançado da hora
errata e efeitos do vinho
o poeta sai de fininho.
(será mesmo com dois esses
que se escreve paçarinho?)
HOLLANDA, Heloisa Buarque de. 26 poetas hoje. 2.ed. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2007, p.41.
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