Amiúde penso: há de haver arcas de tesouros
onde estas muitas vidas jazem todas
como couraças, como liteiras ou berços
a que jamais subiu um ser autêntico,
e que são como roupas que vazias
não se aguentam em pé e ao caírem dobram-se
junto às grossas paredes de pedra trabalhada...
E quando à noite eu me afasto cada vez mais
de meus jardins, onde eu fico cansado,
eu sei: então todo caminho leva
ao arsenal das coisas não vividas.
Árvore não há lá, ao deixar-se a terra
e, como em volta de um presídio, há um muro
sem janela nenhuma, em sétuplo cercado;
e seus portões, de férreas dobradiças,
armados contra os que ali dentro anseiam,
têm grades feitas por mãos humanas.
RILKE, Rainer Maria. Livro de horas. Trad. Geir Campos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1993, p.109.
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