Um narrador desbragado e típico de Raduan Nassar afirma esta preciosidade: "já cheguei a um acordo perfeito com o mundo: em troca do seu barulho, dou-lhe o meu silêncio." As palavras pairam diante de minha inquieta atenção, um desejo pelas palavras como se nelas estivesse a chave. Não está, porque não há nenhuma chave. Quase toco as palavras, e é um mundo de silêncio e vozes e ecos que repercutem naquilo que vai se escrevendo por força de desejá-las. Não posso dar-me o luxo de fazer acordos perfeitos com o mundo: ele me exige, exige minha performance pela linguagem no exercício da profissão, o que resvala para o barulho. Mas estou tateando acordos comigo mesma: sempre que posso, dou-me o prazer do silêncio. Que pode ser entendido também como prazer da escrita. A escrita que se constrói como um amor inútil, amor pelo amor, porque já não se consegue viver sem ela:
SOBRE ESCREVER
Às vezes tenho a impressão de que escrevo por simples curiosidade intensa. É que, ao escrever, eu me dou as mais inesperadas surpresas. É na hora de escrever que muitas vezes fico consciente de coisas, das quais, sendo inconsciente, eu antes não sabia que sabia.
LISPECTOR, Clarice. A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999, p.254.
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