Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Dylan Thomas

E A MORTE NÃO TERÁ DOMÍNIO

E a morte não terá domínio.
Nus, os mortos há de ser um.
Com o homem ao léu e a lua em declínio.
Quando os ossos são só ossos que se vão,
Estrelas nos cotovelos e nos pés;
Mesmo se loucos, há de ser sãos,
Do fundo do mar ressuscitarão
Amantes podem ir, o amor não.
E a morte não terá domínio.

E a morte não terá domínio.
Sob os turvos torvelinhos do mar
Os que jazem já não morrerão ao vento,
Torcendo-se nos ganchos, nervos a desfiar,
Presos a uma roda, não se quebrarão,
A fé em suas mãos dobrará de alento,
E os males do unicórnio perderão o fascínio,
Esquartejados não se racharão
E a morte não terá domínio.

E a morte não terá domínio.
Os gritos das gaivotas não mais se ouvirão
Nem as ondas altas quebrarão nas praias.
Onde uma flor brotou não poderá outra flor
Levantar a cabeça às lufadas da chuva;
Embora sejam loucas e mortas como pregos,
Testas tenazes martelarão entre margaridas:
Irromperão ao sol até que o sol se rompa,
E a morte não terá domínio.

*

And death shall have no dominion.
Dead men naked they shall be one
With the man in the wind and the west moon;
When their bones are picked clean and the clean bones gone,
They shall have stars at elbow and foot;
Though they go mad they shall be sane,
Though they sink through the sea they shall rise again;
Though lovers be lost love shall not;
And death shall have no dominion.

And death shall have no dominion.
Under the windings of the sea
They lying long shall not die windily;
Twisting on racks when sinews give way,
Strapped to a wheel, yet they shall not break;
Faith in their hands shall snap in two,
And the unicorn evils run them through;
Split all ends up they shan't crack;
And death shall have no dominion.

And death shall have no dominion.
No more may gulls cry at their ears
Or waves break loud on the seashores;
Where blew a flower may a flower no more
Lift its head to the blows of the rain;
Though they be mad and dead as nails,
Heads of the characters hammer through daisies;
Break in the sun till the sun breaks down,
And death shall have no dominion.
 

CAMPOS, Augusto. Poesia da recusa. São Paulo: Perspectiva, 2006, p.334-337. 

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