A MORTE DA TARTARUGA
O menininho foi ao
quintal e voltou chorando: a tartaruga tinha morrido. A mãe foi ao quintal com
ele, mexeu na tartaruga com um pau (tinha nojo daquele bicho) e constatou que a
tartaruga tinha morrido mesmo. Diante da confirmação da mãe, o garoto pôs-se a
chorar ainda com mais força. A mãe a princípio ficou penalizada, mas logo
começou a ficar aborrecida com o choro do menino. “Cuidado, senão você acorda o
seu pai”. Mas o menino não se conformava. Pegou a tartaruga no colo e pôs-se a
acariciar-lhe o casco duro. A mãe disse que comprava outra, mas ele respondeu
que não queria, queria aquela, viva! A mãe lhe prometeu um carrinho, um
velocípede, lhe prometeu uma surra, mas o pobre menino parecia estar mesmo
profundamente abalado com a morte do seu animalzinho de estimação.
Afinal, com tanto choro,
o pai acordou lá dentro, e veio, estremunhado, ver de que se tratava. O menino
mostrou-lhe a tartaruga morta. A mãe disse: ― “Está aí assim há meia hora,
chorando que nem maluco. Não sei mais o que faço. Já lhe prometi tudo mas ele
continua berrando desse jeito”. O pai examinou a situação e propôs: ― “Olha,
Henriquinho. Se a tartaruga está morta não adianta mesmo você chorar. Deixa ela
aí e vem cá com o pai”. O garoto depôs cuidadosamente a tartaruga junto do
tanque e seguiu o pai, pela mão. O pai sentou-se na poltrona, botou o garoto no
colo e disse: ― “Eu sei que você sente muito a morte da tartaruguinha. Eu
também gostava muito dela. Mas nós vamos fazer pra ela um grande funeral.”
(Empregou de propósito a palavra difícil). O menininho parou imediatamente de
chorar. “Que é funeral?” O pai lhe explicou que era um enterro. “Olha, nós
vamos à rua, compramos uma caixa bem bonita, bastante balas, bombons, doces e
voltamos para casa. Depois botamos a tartaruga na caixa em cima da mesa da
cozinha e rodeamos de velinhas de aniversário. Aí convidamos os meninos da
vizinhança, acendemos as velinhas, cantamos o “Happy-Birth-Day-To-You” pra
tartaruguinha morta e você assopra as velas. Depois pegamos a caixa, abrimos um
buraco no fundo do quintal, enterramos a tartaruguinha e botamos uma pedra em
cima com o nome dela e o dia em que ela morreu. Isso é que é funeral! Vamos
fazer isso?” O garotinho estava com outra cara. “Vamos, papai, vamos! A
tartaruguinha vai ficar contente lá no céu, não vai? Olha, eu vou apanhar ela”.
Saiu correndo. Enquanto o pai se vestia, ouviu um grito no quintal. “Papai,
papai, vem cá, ela está viva!” O pai correu pro quintal e constatou que era
verdade. A tartaruga estava andando de novo, normalmente. “Que bom, hein?” ―
disse ― “Ela está viva! Não vamos ter que fazer o funeral!” “Vamos sim, papai”
― disse o menino ansioso, pegando uma pedra bem grande ― “Eu mato ela.”
MORAL: O IMPORTANTE NÃO É A MORTE, É O QUE ELA NOS TIRA.
MORAL: O IMPORTANTE NÃO É A MORTE, É O QUE ELA NOS TIRA.
FERNANDES, Millôr. Fábulas
fabulosas. Rio de Janeiro: Nórdica, 1999, p.98-99.
Nenhum comentário:
Postar um comentário