“Sempre sei, realmente. Só o que eu quis, todo o tempo, o que eu pelejei por achar, era uma só coisa ― a inteira ― cujo significado e vislumbrado dela eu vejo que sempre tive. A que era: que existe uma receita, a norma dum caminho certo, estreito, de cada uma pessoa viver ― e essa pauta cada um tem ― mas a gente mesmo, no comum, não sabe encontrar; como é que sozinho, por si, alguém ia poder encontrar e saber? Mas, esse norteado, tem. Tem que ter. Se não, a vida de todos ficava sendo sempre o confuso dessa doideira que é. E que: para cada dia, e cada hora, só uma ação possível da gente é que consegue ser a certa. Aquilo que está encoberto; mas, fora dessa consequência, tudo o que eu fizer, o senhor fizer, o que beltrano fizer, o que todo-o-mundo fizer, ou deixar de fazer, fica sendo falso, e é o errado. Ah, porque aquela outra é a lei, escondida e visível mas não achável, do verdadeiro viver: que para cada pessoa, sua continuação, já foi projetada, como o que se põe, em teatro, para cada representador ― sua parte, que antes já foi inventada, num papel...”
ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. São Paulo: Círculo do Livro, 1984, p.370-371.
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