Eu havia acabado de passar no mestrado em Estudos Literários na Ufes (Universidade Federal do Espírito Santo). No dia em que recebi a notícia, comprei na banca em frente à universidade o livro Infância, de Graciliano Ramos, e registrei: Vitória, 27-03-02, após minha assinatura. Muita coisa estava ficando para trás. E muita coisa estava acontecendo naquele gesto simples de comprar o livro Infância e marcá-lo com a palavra Vitória, nome da capital do meu estado, Espírito Santo. Um rio subterrâneo fluindo, deixando-me finalmente na minha terceira margem, de onde se abriu em leque minha existência, com toda a dor e medo e sofrimento que tal abertura pode comportar. Mas também com uma alegria íntima de saber que eu estava conseguindo. Conseguindo o quê? Não sei. Apenas sei que estava conseguindo, como sabia de forma pouco palpável no momento, ao comprar o livro.
Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.
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