Quando, na caminhada noturna, vou chegando perto de
uma região mais sombreada e vazia, lembro-me do acontecido no último Natal, e
percebo que esse acontecido quer encontrar lugar nas palavras, está pedindo por
isso, porque se recusa a tornar-se esquecimento. Fico imaginando que milagres
poderia conceber a partir das palavras, e contudo ainda não consegui encontrar
aquelas que vão dar ao acontecido o contorno que ele está pedindo. Então
hesito.
Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.
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